novembro 22, 2012

O ideal.


Foi definido que mãe que é mãe de verdade cuida dos filhos pessoalmente, acorda feliz da vida e abre a janela do quarto dos filhos com um otimista “Bom dia!”, com o café já na mesa, torradas quentinhas, queijo fresco, leite na temperatura decidida pelo filho e na exata proporção de café ou chocolate ditada pelo pequeno – ou nem tão pequeno assim. Ela também confere todo o material escolar, comparece a todas as reuniões oficiais e não oficiais, conhece todos os amiguinhos e respectivas famílias. Prepara o  prato preferido de sua cria como ninguém nunca conseguirá fazer, com ingredientes frescos adquiridos naquele mesmo dia, devidamente acompanhado de suco e sobremesa, sempre com um sorriso fácil nos lábios e, claro, de salto alto. Sim, porque ela é mãe e mulher.

Recebe os amigos dos filhos da forma mais carinhosa possível com bolo quentinho, pipoca amanteigada e biscoitinhos delicadamente dispostos em uma toalha alegremente estampada com um vaso de flores coloridas no meio, constrastando com a cozinha imaculadamente branca e limpa. O excesso de adjetivos foi proposital. Uma mãe de verdade só tem qualidades  dessa natureza.

Essa mesma mãe, depois de ter produzido o dia todo em um mercado competitivo – não me perguntem em que momento – usando palavras da moda como networking, MBA, múltiplos de Ebitda, sinergia, inserção, responsabilidade social, chega em casa a tempo de rever as tarefas com os filhos, preparar o banho, colocá-los na cama, contar estórias sentada na cama com uma camisola branca longa – também não posso responder a que horas a camisola foi colocada – e, por fim, tomar um vinhozinho com o marido enquanto ele reclama de como o seu dia foi exaustivo. Tudo isso devidamente maquiada, depilada, sobrancelha cuidadosamente delineada, cabelos brilhantes e domados à perfeição, unhas feitas e, claro, tendo corrido seus oito quilômetros diários seguidos de um treino de musculação mensalmente modificado pelo seu personal. Apenas para constar, ela também faz terapia uma vez por semana, massagem estética e relaxante e cuida pessoalmente de seu jardim como um hobby.

Mas ela cuida mesmo é dos filhos, do marido e da casa. Sabe exatamente o que está faltando na geladeira, o que é melhor para tirar mancha de roupa branca, fiscaliza de perto a forma de lavar, de passar e de guardar as roupas, conhece o melhor lugar para comprar peixe, a melhor marca de macarrão e de amaciante, agenda dentista, médico, exames de rotina para todos os que dependem dela e os lembra um dia antes, com a precisão de um bisturi. Não esquece aniversários, telefones, datas importantes, recados e consegue planejar e executar um jantar para 40 pessoas sem aumentar dez por cento em seus batimentos cardíacos.

Assim definiram. E nós acreditamos. Acreditamos e buscamos tudo isso. Mas ninguém escreveu um capítulo nessa encíclica com as dificuldades. Nem uma nota de rodapé. Ninguém cuidou de avisar às navegantes que é impossível. Àquelas que discordam, eu repito: É impossível. E não há exceção a essa regra. É impossível ser completamente feliz com sono atrasado há um mês, peito pingando leite e campainha tocando anunciando visitas extremamente formais. É impossível sorrir plenamente quando, depois de um dia exaustivo de trabalho, ao chegar em casa você se depara com crianças sem banho recortando o seu exemplar de assinante da Vogue que sequer tinha visto. Só se for de nervoso. É impossível manter o sorriso diante de uma pirraça enorme no meio de uma loja de departamentos. É impossível sentir a maior felicidade do mundo quando somos avisadas que já passou da hora de retirar a fralda noturna ou de deixar que o bebê se alimente sozinho. 

Não estou dizendo que é impossível ser feliz neste contexto, mas asseguro que a felicidade não é a única companheira das mães. Há frustrações no ser mãe. Qual a mãe que nunca se sentiu frustrada quando, depois de arrumar o bebê com a roupinha perfeita escolhida para aquela ocasião com dias de antecedência e, ao sair de casa, o pequeno coloca para fora o excesso de leite que lhe foi dado, sujando também a bolsa já arrumada com as mamadeiras, chupetas e outras coisas mais? Qual a mãe que nunca se sentiu frustrada quando leva duas horas para sair de casa e, chegando no destino, percebe que esqueceu o remédio de refluxo – sim, quase todas as crianças tem refluxo atualmente - , o bico certo para a mamadeira de água ou a girafinha verde, o hipopótamo roxo, o Barney de 97 cm ou a coleção de livros de capa dura do Relâmpago McQueen sem o qual o pequeno não dará um minuto de sossego?

Mães de verdade não podem esquecer estes itens de primeira necessidade. Mas esquecem. Esquecem uma vez, duas vezes, deixam de comprar o leite em pó que acabou aquele dia porque esqueceram ou porque, simplesmente, não deu tempo. Mães de verdade saem de casa calçando um par de chinelos que nunca usariam em sã consciência no meio de uma crise de faringite. Mães de verdade muitas vezes não sabem o que fazer. A que sabe sempre o que fazer, das duas uma: Ou não é mãe ou já é bisavó. Porque o tempo ensina muita coisa.

 O tempo ensina, por exemplo, que você não é uma mãe desastrosa  só porque não ofereceu frutas à criança naquele churrasco de domingo, porque deixou que tomasse refrigerante na mamadeira para não derramar, porque não o leva na igreja todos os finais de semana, porque não levou um outra muda de roupa para o aniversário do amiguinho e a primeira coisa que aconteceu foi ele derramar molho de cachorro quente na blusa imaculadamente branca.

Acredite, o mundo não vai acabar e seu filho sequer vai lembrar se você esqueceu o presente de aniversário da professora no carro, se você o deixou com a avó ou a babá para ir aquele jantar com o marido ou se chegou um pouco mais tarde durante aquela semana por causa de um prazo.

Mãe de verdade sabe que erra. Sabe que não é perfeita. Tem preguiça de retocar a tinta do cabelo, de manter a depilação rigorosamente em dia, tem dificuldade de comprar o lanche para a escola – porque o mais fácil não é o mais saudável -, tem vontade de se jogar na cama e ficar o dia todo assistindo TV, de comer besteira, de faltar a academia.

Mãe de verdade também tem alguns sonhos comuns. Todas elas sonham com alguém que prepare o cardápio de forma balanceada e atraente para as crianças que adoram massa, para o marido que quer comer carne de porco e para ela, que adora molho de gorgonzola, mas está sempre de dieta. Todas sonham com alguém que separe a roupa, fiscalize a lavagem para não misturá-las, passe impecavelmente todas as peças do guardaroupa, saiba como guardá-las de forma eficiente e bonita, arrume o closet e entenda que, para você é importante que os cabides estejam todos virados para o mesmo lado e as roupas separadas por cores, tamanhos, estação e ocasião. Aliás, alguém, não. Algumas pessoas. Claro, porque é preciso um exército para conseguir levar a vida que buscamos como ideal. Quer dizer, a vida que nos mostraram como ideal. 

É preciso, no mínimo duas pessoas para que o café da manhã esteja na mesa lindamente disposto às 6:45, com o bendito do suco de fruta fresca, porque o de caixinha não é saudável e você possa descer as escadas pontualmente (na minha vida ideal sempre existe essa escada imaginária para descer), já devidamente banhada, maquiada e com a roupa impecavelmente passada e sentar ao seu lugar na mesa, que, claro, possui uma gérbera amarela para alegrar o seu dia. O pão está quentinho à mesa, tem bolo, frutas, queijos e iogurte. Claro, na vida idealizada, não se fala em desperdício ou dieta, nem em intolerância à lactose. Pensando bem, acho que duas pessoas não são suficientes. Vamos colocar quatro. Sim, porque pagar salários, horas-extras, décimo terceiro e conceder férias nunca foi parte de uma vida ideal. 

Ah, mas não é a mãe que tem que fazer tudo isso? Dispensemos as quatro auxiliares. Voltemos à mãe ideal. Ela que fez o bolo, comprou os pães, dispôs os frios e os iogurtes. E colocou a gérbera no centro da mesa. Mas ela não estava acordando os filhos, abrindo a janela e sorrindo ao dizer bom dia????

 É. definitivamente ser essa mãe ideal é contra as leis da física. 




novembro 08, 2012

Pensando.


Sinto o tempo nos meus olhos. Não enxergo como enxerguei um dia. Não vejo mais o que eu via. Talvez seja uma forma da natureza me dizer que o tempo passa. Que eu não sou mais a mesma e que não preciso ser a mesma. 

Caprichosa como sempre, a natureza nos deixa mais deficientes quando podemos ir mais longe. Nos tira vagarosamente a visão quando as coisas começam a parecer claras demais. Talvez na intenção de evitar o sofrimento. Talvez na intenção de nos permitir um descanso. A maturidade não nos deixaria descansar se continuássemos a ver tudo tão claramente. Então, a visão embaça. Fica mais difícil ver de muito perto, ou de muito longe. Melhor assim. 

Enxergar demais pode cegar de vez. Enxergar demais pensando demais e entendendo demais seria exagero e estamos na era da sustentabilidade. Exageros são proibidos, condenados. Nos resta enxergar cada vez menos. Mas pensar cada vez mais. Porque sustentabilidade também é equilíbrio.

outubro 11, 2012

Bem Acompanhadas.


Era cedo ainda. Não tanto, mas cedo. As crianças já estavam na escola. Em uma cidade quente, o dia amanhecer branco é um acontecimento. Um friozinho bom, que, assim como tudo na vida, é relativo. Quando viro a primeira esquina, vejo que, lá em cima, ela continua brilhando. Como se não quisesse ir embora. Como se quisesse continuar observando o que nós, aqui, tão pequeninhos, fazemos durante o dia. Não sei se foi o sol quem permitiu, ou se ela sequer pediu permissão. Se foi um acordo ou uma briga de gigantes. Mas o fato é que ela ainda estava lá.
Me lembrei de quando as meninas eram menores e em uma noite estrelada, voltando para casa de carro, uma delas me perguntou:
- Mãe, por que a lua está seguindo a gente?
Eu respondi:
- Porque vocês são maravilhosas e ela quer levá-las até em casa, para ter certeza de que vocês chegaram bem e vão ter uma noite muito tranqüila.
Não houve réplica. Apenas dois sorrisos vistos pelo retrovisor. Sorrisos de segurança, de calma.
A mais nova chegou a ter medo de fazer alguma coisa errada em outras ocasiões e perder aquela companhia tão linda.
E hoje ela ficou até de manhã. Não consegui mostrá-las, mas, certamente, vou ignorar novamente qualquer traço científico, movimentos de translação e rotação e dizer que ela estava ali, e isso continua a significar uma proteção e um carinho que vem do céu só pra elas. 

julho 25, 2012

Medo de Morcego.

Acomodada que sou, achava que a reforma podia ser adiada mais um pouquinho. Mas, como dizem que os opostos se atraem, marido quer tudo "pra ontem" e, há muito, já se incomodava com o piso quebrado na cozinha e as pedras na fachada da casa construída provavelmente na década de oitenta ou noventa. É, não dá pra viver incomodado. Resolvemos começar o inevitável. Quebra-quebra a partir das sete horas da manhã todos os dias e uma poeira tão grande que não dava para imaginar que seria possível. Tudo perfeitamente previsível. Tem que ficar ruim para ficar bom depois.
Poeira, barulho, estranhos transitando pela casa, nada disso é surpresa. Surpresa foi o que vimos com a retirada de algumas telhas que ficavam sobre as janelas.
No momento em que foram arrancadas, dezenas de morcegos saíram vivos daquilo que, suponho, era um ninho, uma morada, uma pousada para o dia. Como eu pude tê-los tão perto sem nem desconfiar? Tenho medo, tenho nojo, tenho repulsa. Até porque nenhum deles se transformaria em Edward Cullen, Bill Compton, Stefan ou Damon. Nem os vampiros de hoje em dia se transformam em morcegos. Mas, voltando à nossa casa (ou à casa deles), as telhas serviam de abrigo para um dos animais que mais me assusta. Acima da janela do nosso quarto! Acima da janela do nosso closet! Acima da janela do nosso escritório! Convivíamos diariamente com vários morcegos, que descansavam como a cigarra cantarolante da fábula enquanto as formigas aqui ganhavam a vida. E, durante a noite que, enquanto dormíamos, sabe-se lá o que faziam. Só posso dizer que convivemos. Posso até dizer que pacificamente, até porque não sabíamos de suas existências.
Os morcegos saíram, não tem mais o abrigo das telhas. Mas eu fiquei pensando nisso. Se não fosse a reforma, a retirada das telhas, talvez jamais descobriríamos os outros animais que também moravam por aqui. Será que temos outros conviventes por perto? Será que convivemos com outros medos e repulsas dos quais nem temos ideia da existência? Será que existem morcegos também escondidos dentro de nós, que só serão descobertos com a retirada de outras telhas e entulhos? Ou será que o medo só vem com a consciência do que se tem por perto? Sem medo o perigo desaparece ou seria ainda mais ameaçador diante da nossa ignorância? Morcegos, ressentimentos, sentimentos. Acumulamos tantas telhas desnecessárias pela vida que elas vão ficando assim: cheias daquilo que não nos serve, daquilo que nos amedronta, daquilo que nos ameaça. E, quanto mais tempo passa, mais difícil é a reforma.

junho 24, 2012

Amor que viaja.





Deram outro nome para o Amor. Aliás, outro não. Vários outros. Querem, a qualquer custo, que o Amor seja sinônimo de felicidade, de paz, de sucesso, de fotografia, de música, de beijo de cinema. Não acho que seja assim. Não acho que amor possa ser tudo isso e nem tão pouco. Não pode existir amor ser reservas, sem ressalva, sem condições. Ou talvez eu não tenha evoluído a este ponto. Talvez eu seja realmente eu ser de uma pequenez espiritual tamanha que não consiga experimentar esse amor aí, pregado aos quatro cantos. Não amo nem a mim mesma de forma incondicional. Aliás, me odeio tantas vezes. 

Me odeio quando à noite prometo que no outro dia correrei  cinco quilômetros, tomarei três  litros de água, comerei as porções de frutas necessárias e arrumarei os guardaroupas e, quando chega este outro dia, ignoro solenemente tudo aquilo que me parecia tão essencial em troca de algumas horas a mais de sono, televisão, pipoca e coca-cola.Me odeio quando esqueço de verificar a agenda das meninas e percebo, falando dez minutos para o início das aulas, que deveria ter providenciado um bolo de fubá para a festa junina daquele dia. Me odeio quando não ligo para uma tia querida que fez aniversário, ou quando não tiro a maquiagem dos olhos antes de dormir. 

Se me odeio tantas vezes, amaria outra pessoa sem qualquer ressalva? Impossível. Pelo menos para mim. É claro que tomo a liberdade de excluir desse amor condicional as minhas filhas, pois, mesmo odiando acordar no meio da noite ou me deparando com a parede suja de tinta, não deixo de amar. Muito. Agora, os outros amores, são, todos eles condicionais. Cheios de ressalvas. 

Talvez seja essa a beleza. Amar com condições. Amar sabendo que o amor pode acabar a qualquer hora, sabendo que pode não ser para sempre. Amor que não tem nada de paz, de comercial de margarina, de final de novela. Amor que vive uma entrega todo dia, que procura junto a felicidade, mas que não se resume a ela. Amor de gente. Amor de gente que discorda, que é cheia de defeitos, que sente dor, que fica de mau-humor, que tem preguiça, que trabalha demais, que precisa de férias, que quer ficar sozinha às vezes. Amor que às vezes cansa, que às vezes até se perde. 

Amor que não tem resposta para tudo, mas que não cansa de viver perguntando. 

maio 30, 2012

Jogar Tudo para o Alto.

No som do carro, uma música diz que dá vontade de jogar tudo para o alto e ir embora com o "você" escolhido pelo compositor. Sempre me encantei por esta expressão: Jogar tudo para o alto. Existe alguma coisa que expresse mais liberdade do que isso? Sim, sim, eu sei que toda liberdade tem o seu preço e que muitas e muitas vezes não estamos dispostos a pagar. Mas deve ser muito bom jogar tudo para o alto. Nada de romantismo, de fugir com a pessoa amada, de viver um amor debaixo da ponte, de morar em uma barraca na beira da praia sem a menor necessidade de qualquer conforto. Se é que eu já tive essa fase "romântica", já passei dela há muito tempo.

Não queria fugir, tampouco jogar a minha vida e as minhas conquistas para o alto. Mas algumas coisas certamente mereceriam ser jogadas para o maior de todos os altos, de forma que nunca mais voltassem. Talvez algumas coisas até desejadas fossem junto, mas o que seriam essas coisas perto da sensação de liberdade que eu sentiria? Talvez essa sensação de liberdade seja a tal felicidade com a qual todo ser humano sonha, todo dia. Talvez não. E se for exatamente o contrário? E se essa liberdade toda for justamente a maior de todas as prisões?

Filosofia demais para a hora do almoço de uma quarta-feira qualquer. Falar de liberdade é falar do que não conheço. Do que ninguém conhece. Apesar de todos se acharem livres. Liberdade para a minha filha de dez anos é não ter tarefa de casa. Para a de seis, é poder dormir e acordar a hora que bem entender. Para o meu sobrinho-afilhado, é não precisar comer nada além de pipoca. Tantos conceitos. Tantas ideias. Cada liberdade com o seu preço. Alguns até baratos, outros nem tanto. Se uma resolve jogar tudo para o alto e não fazer a tarefa de casa, amanhã ficará até mais tarde no colégio. Se a outra dormir a hora que quiser, não acorda para a escola e, consequentemente não conseguirá atingir o seu maior objetivo hoje: escrever com letra cursiva. Isso sem falar das consequências que eu e o pai - carrascos implacáveis dessas liberdades - teríamos que aplicar. E a dieta do pequeno a base de pipoca? Internação e soro, na certa.

Não dá para jogar tudo para o alto. Algumas coisas, com certeza. Já vou começar a minha lista para os próximos arremessos. Mas TUDO, TUDO, não. Ainda que, muitas vezes, eu seja obrigada a reconhecer, como na música do rádio: "Mas que dá vontade, dá..."



abril 26, 2012

A Pequenez dos Problemas.


Abro o guarda-roupas pela manhã e não tenho nada para vestir, mesmo diante da quantidade de roupas que se apresenta a minha frente. Fico nervosa, reclamo da vida, do corpo, dos quilos que sobram ou dos centímetros que faltam. Ainda esbravejando, recebo o telefonema que avisa que a faxineira não vem. Está com o filho doente. Pronto. Qualquer roupa já está ótima, considerando que não posso me atrasar nem um minuto, pois vou ter que dar conta de mais coisa do que pensava. 

Com o grande problema da falta da faxineira, digo para a minha filha se apressar, ao que ela me responde que a garganta está doendo. Chegando mais perto, verifico que ela está com febre. Nem quero mais saber como a casa está ou como vai ficar. Amanhã a faxineira vem e está tudo resolvido. Ligo para a pediatra e agendo a consulta para as quatro. Por enquanto, apenas um antitérmico e a febre já  vai passando. E quase me esqueço daquela reunião importantíssima do meio-dia. A internet está extremamente instável e não consigo finalizar o envio dos relatórios. Esbravejo mais uma vez por não ter enviado os relatórios antes. Reclamo do computador, do servidor e do Steve Jobs.

Mesmo sem os relatórios, mas com a minha presença, a reunião começa. Os relatórios não poderão ser avaliados porque os dados de comparação não foram apresentados por quem deveria. Pra que mesmo eu perdi tanto tempo com eles? Me desculpe, Steve Jobs,  problema não é você. Problema é ter que lidar com gente descompromissada. Mais um ataque interno. Esbravejo agora contra as pessoas, o sistema educacional, a juventude atual.

E me lembro da consulta da pequena. As pessoas são até boas, problema é o trânsito. Como vou conseguir chegar ao pediatra as quatro? Ainda esbravejando contra o trânsito, a quantidade de carros que as pessoas possuem, a falta de educação no trânsito, chego ao consultório com algum tempo de atraso. A médica também está atrasada. Muito atrasada. Pra que mesmo que eu corri tanto?

Quase uma hora depois de ter chegado ao consultório somos atendidas. Desculpando-se pelo atraso, a pediatra informa que a criança que acabou de deixar o consultório foi diagnosticada com um síndrome rara. Cura? Só Deus. 

Agora eu esbravejo contra mim mesma. Problemas? Só parecem grandes até que um outro apareça.

abril 10, 2012

A Nossa Música.

Sempre achei lindo aqueles casais que tem uma música que consideram deles. Aquela que quando toca, eles se olham com carinho e se lembram de todos os momentos bons que já passaram juntos. Principalmente quando se trata de uma música linda, tipo trilha sonora marcante de filme. Aquelas inesquecíveis mesmo, como "The way you look tonight" e tantas outras.
Há vinte anos eu procuro a nossa música. Queria encontrar uma que pudesse nos fazer lembrar de tudo, de cada momento, de cada conquista, de cada olhar. Nunca consegui encontrar.
Já cheguei a pensar que seria "Wish you were here", pois você sempre diz, todo orgulhoso, que foi tocando essa música no violão que me conquistou, lá no Colégio Marista. Que nada! Você já tinha me conquistado há muito tempo.
Pensando bem, a nossa música poderia até ser "Chorando se foi", para relembrar a lambateria em Porto Seguro quando nos olhamos diferente pela primeira vez. Diferente sim, porque já nos olhávamos há bastante tempo. Antes mesmo de você, com dezessete anos, cantar "The Wall" na abertura dos Jogos Internos Marista para uma multidão de pessoas, com outros amigos nossos na formação da banda. E eu, com quinze, fazia a coreografia da dança vencedora daquele ano com as outras meninas.
Já nos olhávamos diferente quando, na volta daquela excurssão para Porto Seguro, ouvíamos "Por Enquanto" no ônibus, mas começamos a nossa história mesmo ao som da banda Akauã, naquela festa do Clube Itajuby.
Poderíamos escolher também "My Girl", música pela qual ficamos apaixonados quando assistimos ao filme Meu Primeiro Amor, e você, já no outro dia, comprou para mim a fita cassete da trilha sonora. Sim, a fita cassete. Porque a nossa história é do tempo da fita cassete.
Ou, ainda, Vento Ventania, que cantávamos juntos e muito alto naquele escort marrom do seu pai quando voltávamos da faculdade. E Elton John, que foi colocado para finalizar a filmagem do nosso casamento? Ah, tem também o Eros Ramazotti, que ouvíamos sem parar na nossa lua-de-mel. Ou o Santana, que me fez enlouquecer em um shopping de Campinas à procura do DVD.
Tivemos a época de termos apenas o Txutxucão como trilha sonora, já que não éramos mais só dois, mas três. E depois, quatro, como somos hoje.
Aliás, hoje, a nossa trilha sonora passa por Kate Perry, Demi Lovato, Lady Gaga, Rihanna, Selena Gomez, Adele e tantos outros ídolos das nossas pequenas, já que a música no carro não somos mais nós quem escolhe. E tantas e tantas vezes estamos lado a lado ouvindo músicas diferentes. Muitas vezes eu critico o seu Bee Gees enquanto você não tem paciência para a minha Rita Lee. Mas, no final das contas, todas elas entram no IPod.
De tanto procurar a NOSSA MÚSICA, eu acabei acreditanto que não podemos ter uma. Porque você não é um só pra mim. E eu não sou uma só para você. Somos muitos para nós mesmos. ´Muitas músicas, muitos anos. Não cabe tudo isso em uma música só. E, de verdade, acho que nem queremos mais que caiba...

abril 08, 2012

Pouco Caso.

Sou de poucas palavras, mas não gosto de pouco caso.
O pouco me incomoda. Não gosto de pouco tempo. Não gosto de pouco espaço.
Dormir pouco me maltrata. Não gosto de poucos travesseiros na cama.
Não gosto de pouca calda de chocolate no sorvete. Não gosto de pouco gelo na coca-cola.
Não gosto de pouco requeijão na torrada.
Não gosto de pouco sorriso. Não gosto de poucas folhas em branco.
Não gosto de pouco perfume, nem de pouca espuma na hora do banho. Não uso pouco hidratante.
Não gosto de poucos sapatos. Apesar da pouca altura, não gosto de pouco salto.
Não gosto de pouca música, nem de poucos livros.
Não gosto de pouca inteligência, nem de pouco humor.
Não gosto de ter poucas opções, mesmo que escolha sempre as mesmas.
Não gosto de poucas cores. Muito menos de poucos amores.




março 16, 2012

Como a vida.

Então, o acaso planejado. Uma avalanche vagarosa de palavras que aparecem escondidas de vez em quando. Uma vontade de dizer um silêncio alto que incomodaria qualquer surdez. Sem sentido nenhum, mas de uma lógica irracional enormemente pequena. Uma multidão solitária que procura de forma sabiamente ignorante o que já possui, enxergando a constelação de uma estrela solitária com brilho fosco que mostra um lugar inexistente.

Um vazio cheio de loucuras sensatas que permitem interpretações igualmente diversas e levam a conclusões concretamente abstratas. Advérbios que se sujeitam a um adjetivo de orações descrentes. Uma matemática subjetiva conjugada com uma filosofia exata. Sentimento pleno de que falta alguma coisa que não se sabe o que é, mas cuja certeza é absolutamente relativa.

Uma música muda que se dança individualmente em pares. Um cheiro azul de gosto vermelho, palidamente colorido. Um sentimento curto, um vento salgado que sopra de frente, em uma linha reta que circula o coração. Uma confusão organizada de sentimentos encaixotados em sacolas hermeticamente abertas que retornam para aonde nunca estiveram.

Não é para fazer sentido. É para sentir. Não é para entender, sequer para explicar. É para gostar, ou não. Complexamente simples. Emocionalmente racional. Como a vida.

fevereiro 03, 2012

Minha Amiga Mulher Maravilha.

Quando eu era criança eu achava o máximo a Mulher Maravilha. Ela era forte, guerreira, inteligente, mantinha os cabelos escovados, os olhos delineados, a pele perfeita e ainda tinha um avião invisível!! Mais tarde, fui desiludida pela verdade: Aquela Mulher Maravilha não existia. Por mais que eu tentasse, eu nunca poderia ser igual a ela, tampouco ter um avião invisível.

Felizmente, o tempo nos dá a chance de mudarmos de ideia. Hoje, já acredito novamente na Mulher Maravilha. Ela não precisa ter os cabelos negros e perfeitamente escovados o tempo todo. Não precisa de olhos azuis, de laço mágico ou avião invisível. Ela consegue ser MARAVILHA sem qualquer uma dessas coisas. Aliás, ela consegue ser  mais MARAVILHA ainda, porque é real.

Não nasceu na Ilha do Paraíso - apesar de ter a carteira de identidade mais estranha que já conheci -, nem é filha da rainha das amazonas. Não tem braceletes indestrutíveis para desviar balas e raios, nem uma tiara que pode ser utilizada como bumerangue. Mas consegue muito mais com uma embalagem de lenços umedecidos e algumas canetinhas coloridas. Seus super-poderes são os melhores do mundo. Nenhuma amazona de história em quadrinhos poderia ter tanta criatividade, paciência, habilidade e fazer tudo com tanto amor e tanto carinho. Nenhuma heroína daria conta dessa minha Mulher Maravilha.

Sim, eu digo que ela é minha mesmo. Não SÓ minha, mas também. É minha também porque temos coisas em comum que ninguém mais tem. Temos um coração em comum, traduzido na amizade linda de nossas princesas mais velhas. Amizade que eu peço a Deus que nunca acabe. Temos outro coração em comum, traduzido na semelhança "quase-irmã" de nossos maridos que passaram a ser assim chamados quase no mesmo dia. Coração em comum que bate enlouquecido em uma papelaria, livraria, perfumaria e várias outras "ias"da vida que só a gente entende. Que gosta até mesmo dos mesmos cheiros e dos mesmos sabores.

Minha Mulher Maravilha é isso tudo e mais um pouco. Dá jeito em tudo e ainda consegue perdoar e relevar a minha "falta de jeito"para quase todas as coisas. Ela é daquelas amigas que a gente tem a nítida impressão de que nunca vai conseguir fazer por ela o que ela faz por nós. Daquelas amigas que conseguem fazer a gente se sentir em casa mesmo quando estamos longe. Daquelas que a gente tem a certeza de que agirão exatamente como agiríamos. Daquelas que a gente deixa os filhos como se estivessem com a gente.  Daquelas que a gente não encontra em qualquer esquina, nem em qualquer vida. Daquelas MARAVILHOSAS. Daquelas que, mesmo sem o shortinho azul de estrelinhas brancas e o tomara-que-caia vermelho com dourado, podem e devem ser chamadas de Mulher Maravilha. Amiga Maravilha. MINHA AMIGA MULHER MARAVILHA.