dezembro 05, 2011

Paradoxo Cosmopolita.

Nascemos muito perto. No tempo e no espaço. Nossas mães eram próximas, primas e vizinhas. Nossas avós ainda mais. Concunhadas, vizinhas, companheiras. Apesar de toda essa proximidade, nos encontramos mesmo alguns anos depois. Já havíamos brincado juntas, saído juntas algumas vezes na adolescência, mas este encontro a que me refiro é outro. É encontro de conhecer, de descobrir, de aproximar, de confiar, de gostar de ficar perto.

 Encontro que dura, que permite acontecer de novo, que dá a oportunidade de até esquecer o parentesco que existe e lembrar somente de laços que escolhemos. Escolhemos porque assim queremos, sem que ninguém nos peça para ser assim. Afinidade. Amizade. Amizade que permite reconhecer uma alma cosmopolita que convive com um coração completamente interiorano. Ela é assim mesmo: Paradoxal. Um paradoxo que encanta, e que permite falar, com a mesma empolgação dos meses que passou na California e em Londres e do pic-nic que fazemos na pracinha em frente a minha casa.

Um paradoxo que cobiça Louis Vuitton e Hermès assim como eu, mas que troca qualquer coisa pelo direito de andar de chinelo e sem maquiagem e poder falar o que pensa. Um paradoxo que valoriza as pequenas coisas, ir trabalhar a pé, usar camisola branca de algodão, se deliciar com uma panela enorme de carangueijos. Um paradoxo que poderia gerar quantos filhos quisesse no seu ventre, mas, depois do primeiro, está gerando um no coração, com uma certeza tão grande que leva todo mundo junto, como se estivéssemos todos ao seu lado vivendo uma gestação de amor.

Conseguir fazer com que uma alma assim, cosmopolita, conviva tão intensamente com um coração interiorano não parece ser tarefa fácil. Não para qualquer um. Mas ela tira de letra. E quando não tira assim tão fácil, busca. E quando buscar parece difícil, ela pode até falar, gritar, pedir ajuda, trocar ideias, mas vai em frente.

Adora apelidos, talvez por querer mostrar como é mais fácil viver quando descomplicamos um pouco e abreviamos os processos. Adora casa bonita, talvez para ensinar que o que temos por dentro é o mais importante.  Adora viajar, sem talvez, mas certamente porque adora o novo, sem deixar com que as suas raízes falem tão alto quanto as novas experiências.

Faz questão de muito, mas parece precisar de tão pouco para ser feliz. E eu quero sempre acompanhar esta felicidade. Bem de pertinho. Com nossas Neverfulls, Birkins, Alexas, Speedys ou com nossas havaianas e crianças no parquinho da casa da Bisa. Tanto faz. Um paradoxo mesmo. Delicioso de viver e de acompanhar. Delicioso de ter por perto. Um paradoxo tão certo e claro. De uma clareza paradoxal encantadora. Um paradoxo que hoje faz aniversário e que a quem eu desejo um mundo de cores, amores e sabores. Bem do jeito que ela gosta!

setembro 28, 2011

TOMOGRAFIA.

Uma dor de cabeça chata, que vira e mexe volta e acaba assustando. É assim comigo também. Sempre foi. Mas com você, filha, é diferente. Se a sua cabeça dói, a minha explode também. A minha, há pouco tempo fiz alguns exames e não descobri nada de especial. Mas eu podia ter todos os dias, desde que a sua não doesse. Ah, não! Dor de cabeça em você, não...

Mas, enfim, como nem sempre o que desejamos para nossos filhos se realiza, você também é vítima dela. A Pediatra resolveu pedir alguns exames. Sangue, urina, fezes, vista e uma tomografia.  É claro que eu sei que é uma precaução, um zelo, vamos ver logo tudo. Mas filho não podia ter que fazer exames. Principalmente tomografias. Você sofreu mais no exame de sangue (ainda que tenha dito que não, do alto dos seus nove anos), mas tomografia tem jeito de coisa séria. Você achou até divertido, meio futurista, eu acho. Mas, eu? Eu não gostei nada, nada. Essas coisas tinham que ser reservadas apenas para adultos já plenamente conformados com a rapidez da vida - ainda que eu não saiba se exista algum assim - mas não para filhos. Estejam eles com nove meses, nove anos ou até noventa, se ainda tivesse uma mãe. Filho não. Filho tinha que nascer saudável, assim permanecer e nunca morrer. Pelo menos enquanto ainda fosse filho.

Filho tinha que ser imune a qualquer vírus, bactéria, tinha que ter super-poderes para resistir a qualquer acidente. Filho tinha que ser de ferro. Mas é de carne e osso. Assim como as mães. E, normalmente, com as mesmas ou parecidas "falhas"genéticas e predisposições. Maldita hereditariedade. As mães, poderosas como só elas podem ser, deveriam ser capazes de criar modelos atualizados, corrigir defeitos que sentiram em si mesmas, chegar quase à perfeição. Não seria na hora da concepção que as mães mais se assemelham a Deus?

Talvez por essa semelhança é que não possamos fazer tudo o que queremos. Não podemos proteger nossos filhos de todos os vírus do universo, todos os males da vida. Afinal, é um outro ser humano que está ali. Nasceu da gente, mas tem o seu próprio caminho, suas próprias escolhas. Vamos ter que assistí-los errar, adoecer, acertar, melhorar, cair. Muitas vezes vamos poder ajudar, mas em outras vezes, sequer saberemos da enfermidade ou da dificuldade. Ou, ainda pior, os filhos não vão querer a nossa ajuda, achando que podem suportar sozinhos. É ou não é divina essa relação?

Felizmente, filha, a tomografia revelou pura normalidade. Em poucos segundos, o exame foi realizado. Nada de diferente. De estranho, apenas uma coisa. A atendente te posicionou corretamente na máquina, pediu que você ficasse bem quietinha e disse:

_ Laura, vou pedir a sua mãe para esperar ali na outra salinha comigo, para que ela não se exponha à radiação sem necessidade. Mas, não se preocupe, ela vai estar ali, te olhando por aquele  vidro, tudo bem?

E quando eu estava prestes a dizer: "Sem necessidade? É minha filha, ela é quase um bebê! Ela vai me querer ao lado dela!!! Nada disso, eu fico aqui", você foi mais rápida, filha. E disse, tranquilamente: "Tudo bem!".

E eu, mesmo depois dessa filosofia toda e de repassar mentalmente todas as possibilidades existentes em um curto espaço de tempo, só pude ficar na sala ao lado. Te olhando pelo vidro.

setembro 08, 2011

Catavento Colorido


Um Catavento é uma coisa linda. Se for colorido, então…É um daqueles objetos que me fazem parar para olhar e pensar. Um catavento raramente  está parado. Se está, é porque a natureza parou um pouquinho para pensar. Mas só um pouquinho. Quando está em movimento, as cores se modificam, se misturam, criando a cada segundo uma imagem diferente. Difícil escolher a mais bonita. Se está em movimento, alegra, colore, diverte. Mas mesmo parado, tem a sua beleza.  Pode existir para embelezar ou até ter uma função quase científica. De um jeito ou de outro, é um catavento. O mais bonito disso tudo? Ele não cata o vento para si. Cata para se movimentar, mas devolve. Não guarda nem um pouquinho. E nem conseguiria. Ele não foi feito para guardar. Foi feito para passar, mover, fluir.
São como algumas pessoas. Incapazes de guardar um pensamento, uma palavra, um sentimento, uma oração. Incapazes de guardar para si. Ao serem tocadas, precisam passar para frente. Precisam fazer com que os outros também sintam aquela beleza ou vejam aquele frescor. Assim mesmo, trocando os sentidos, porque uma pessoa catavento consegue ver o cheiro e sentir a beleza e as cores. Não consegue passar despercebida diante da sua espontaneidade.
Onde houver vento, não será possível segurar o catavento. E nem dá vontade de tentar, porque a sua beleza está no seu movimento.  Eu conheço uma pessoa catavento. Catavento colorido, lindo. Catavento que eu vi crescer, que eu vi aprontar bastante, que eu já tive até que esperar chegar acordada na sala. Catavento que eu vi mudar, que eu vi amadurecer, que eu vi formar uma família linda, Catavento que não guarda mesmo, nem um sentimentozinho para ela mesma. Catavento que já teve que ouvir “Cuidado” várias vezes por causa disso, e que pode até vir a girar um pouquinho mais devagar por conta de alguns ventos que vem na direção errada ou que mudam de direção de uma hora para outra. Mas que vai continuar sendo catavento. Que passa, que alegra, que faz o mundo mais bonito.  Catavento colorido que eu quero  continuar a ver girar, bem de pertinho. 

agosto 26, 2011

Coleção.

Quando criança, sempre quis ter uma coleção. Achava lindo quem colecionava objetos e mantinha tudo na mais perfeita ordem para satisfazer o seu próprio orgulho. Cheguei a começar algumas. Figurinhas, chaveiros,borrachas de cheiro, aquelas mini-garrafas de coca-cola que vinham em um micro engradado vermelho.

A maior de todas elas foi, sem dúvida, a minha coleção de papéis de carta. Pastas e mais pastas pretas de plástico com os papéis arrumados com o respectivo envelope e, às vezes, até com um adesivo para fechar o envelope que nunca seria usado. Trocava os papéis de carta repetidos com as amigas, vibrava quando encontrava algum modelo diferente, transparente, brilhoso e até cheiroso. Ficava horas e horas colocando os papéis na pasta e escolhendo - eu mesma, concorrente e júri - o mais bonito. 

Com o tempo, os papéis foram se perdendo, amarelando, rasgando. Nem das pastas eu tenho mais notícia. E nem poderia, considerando a crise alérgica que me causariam. Mas chego a me arrepender de não ter escrito naqueles papéis tão lindos, de não ter distribuído aquelas cartas não escritas, de ter deixado tudo perecer em função do excesso de zelo do qual eu cheguei a me orgulhar.

Continuo gostando de papéis, mesmo os coloridos, brilhantes e cheirosos, apesar de não ter mais oito anos e apesar de viver a era digital em todo o seu máximo conceito. Mas hoje não guardo. Não coleciono. Escrevo em todos. Nem que seja para mim mesma. Escrevo com o mesmo capricho que os guardava  naquela época. 

Colecionar objetos já não me fascina e me traz até uma certa fobia. Afinal, vivemos um tempo de falta de espaço e de tempo, duas das principais coisas que um colecionador precisa ter. Mas, como sempre acabamos por guardar traços da infância durante toda a vida, colecionadora eu pretendo continuar a ser. Hoje, coleciono sentimentos, sorrisos, sonhos, lembranças. Coleciono o que não precisa de espaço para ser guardado, e, o que é melhor, que pode ser pego, exposto e lembrado a qualquer hora. 

Coleciono sorrisos das minhas filhas, carinhos do meu marido, apoio da minha mãe, bençãos da minha avó, risadas das minhas amigas, momentos felizes da minha família, quilômetros corridos, barreiras quebradas, lugares conhecidos, cheiros e sabores sentidos, horas de sono, beijos e abraços. Coleciono até a saudade do que eu queria ter um pouco mais perto de mim. Coleciono vida. E só.


agosto 10, 2011

Alguns dias.


Alguns dias passam pela vida da gente sem que sejam sequer notados. Parecem que tampouco foram vividos. Quando crianças, poderíamos chamá-los de “ dias café-com-leite” ou qualquer coisa parecida. Um dia sem marca, sem cheiro, sem sabor. 

A sorte é que no meio desses dias sem predicados,  passamos por dias que se destacam no meio da multidão. Dias vividos de verdade. Dias com memórias, com cheiro, com sabor. Dias que nos fazem sorrir só de lembrar. Dias com brilho próprio. Dias que pareceram ter mais do que as vinte e quatro horas comuns aos demais. Aqueles que mereceriam páginas coloridas no diário de uma adolescente da minha época ou, ainda, registros incansáveis e cheios de entrelinhas para os facebooks  de hoje.  Minha filha mais velha diria que são dias irados, muito legais. A pequenina diria que são dias brilhantes, cor-de-rosa com glitter. Dias que dão inspiração, que compensam uma vida inteira, que dão fôlego.

Em alguns dias, parecemos fazer parte de uma grande dúvida, sem saber para onde ir ou aonde ficar. Caberia até trilha sonora do The Clash, algo como “Should I stay our should I go”.  Outros dias não conseguem ter uma trilha sonora, não chegam a esse nível de emoção,  representam apenas a incansável repetição de uma rotina também café-com-leite,  como na música Família, Titãs: “Almoça junto todo dia, nunca perde essa mania”.  

Apesar de gostar de rotina, chego a pensar que às vezes é necessário nadar contra a corrente, só pra exercitar. Todo o músculo que sente. E pedir um bis de presente, pro dia nascer feliz, como diria Cazuza – de quem eu não sou fã, em absoluto, mas sou obrigada a me render à beleza das suas alucinações poéticas.

Nando Reis – outro gênio alucinado – diz que o dia pode ser vertical. Assim eu quero os meus dias. Verticais. Buscando chegar a um lugar mais alto, tão longe como a lua corre. Mas...Se amanhã não for nada disso, caberá só a mim esquecer. O que eu ganho, o que eu perco, ninguém precisa saber. 

julho 23, 2011

Rodízio da Vida.

Novidades culinárias nem sempre me agradam. Meu paladar é, ainda, de criança. Pipoca, brigadeiro, macarrão, pizza, banana. Troco fácil, fácil um cordeiro ao molho de ervas por um queijo-quente. Mas, como tudo muda (graças a Deus), às vezes me habituo a um novo sabor. Bom, foi assim com a comida japonesa. Quando o mundo todo começou a enjoar, eu resolvi experimentar. E gostei. Gostei muito, para dizer a verdade. E, então, como acontece com toda (ou quase toda) comida que vira moda, criaram o rodízio de comida japonesa. Não me parece nem um pouco herança da cultura japonesa, mas a ideia é bastante sedutora. Está tudo à disposição, por um único preço. Basta pedir. E comer. E foi aí que a coisa me pareceu ainda mais interessante.

Ao contrário do que acontece em outras espécies de rodízio, no de comida japonesa, o que você pedir e não comer, tem que pagar. Nunca pensei em tamanha sensatez. Me lembrei de todas as vezes em que vi pratos e pratos de carne intocadas ou de pizzas das quais apenas uma mordida foi dada indo para o lixo em infindáveis rodízios. Aquele pensamento de uma cultura atrasada que leva ao terrível argumento de que "se eu paguei, é meu. Eu tenho direito, nem que seja para jogar fora."

No rodízio de comida japonesa não. Pede-se o quanto quiser, mas nenhum exagero ou desperdício. Se não comer, tem que pagar. Ou seja, o preço continua único, come-se o quanto quiser ou puder, mas nenhum pedido é feito sem que o bom-senso de cada um seja ativado. Completamente diferente. Sensato. Está à sua disposição, mas você deve pegar o quanto precisa, nem mais, nem menos.

Assim, penso eu, poderia ter agido Deus ao criar o mundo. Deveria ter deixado tudo à disposição do ser humano, mas só poderíamos usufruir daquilo que realmente fosse necessário. Se houvesse desperdício ou o uso errado do que estivesse a nossa disposição, pagaríamos o preço. Enfim, poderíamos ter tudo, mas somente o tudo que nos fosse necessário. Se pedíssemos a mais, arcaríamos com as consequencias. Ele estaria ali, pronto para ouvir os nossos pedidos e providenciá-los da melhor forma possível, mas deveríamos saber pedir, ativar o bom-senso, pensar no antes, no durante e no depois. Pediríamos com cautela, pois, apesar de todos termos pago um valor único por tudo aquilo, algumas contas seriam acertadas somente no final, quando o jantar - ou a vida - tivessem chegado ao fim.

Pensando melhor, acho que foi exatamente assim que ele agiu. E age. Está tudo aqui, aí, a nossa disposição. O preço único por tudo isso já foi pago. Podemos e devemos pedir. Talvez a nossa grande dificuldade seja exatamente descobrir o que é, de fato, necessário e o que será desperdiçado.

Se Deus é sensato - e é no que eu acredito - age exatamente como no rodízio de comida japonesa. A intenção não é punir, é simplesmente equilibrar, permitir que as coisas aconteçam da melhor forma possível, sem sacrifícios, sem exageros, sem desperdícios.

Saber o que pedir, quando pedir e quanto pedir. Talvez seja esse o segredo. Ele não hesitará em conceder, mas, a conta, no final, será de nossa responsabilidade...

julho 13, 2011

Desconfiança.

Interessante o ser humano. E sórdido, muitas vezes. Falamos de forma tão natural sobre o perdão mas não sabemos como agir quando precisamos perdoar. É claro, estou falando dos erros dos outros porque os nossos erros são extremamente "perdoáveis", afinal, nunca fazemos por mal. Nunca erramos para machucar alguém ou para espalhar o mal, semear a discórdia, criar conflitos. Nós não. Os outros sim. Os erros dos outros são sempre piores. Claro, os outros não são tão bem intencionados como nós, assim, como que por óbvio, é tão mais fácil perdoar-nos. Se estivéssemos na pele dos outros, nos perdoaríamos facilmente. Afinal, nunca são graves assim os nossos erros.

Os erros dos outros, ao contrário, merecem uma (des)atenção maior. Será que é verdadeiramente possível perdoar os outros por completo? Eu achava que sim. Passei a desconfiar. Aliás, hoje, tenho quase certeza de que o perdão só existe para os nossos erros. Falo de perdão sincero, pleno. Porque o perdão superficial, aquele que aparece mas guarda com ele os erros cometidos, acho até que é fácil conceder. Esse perdão fácil  permite a convivência, mas impossibilita a entrega. Perdoando assim, estamos sempre desconfiando, vigiando, acusando, perseguindo, humilhando, massacrando, machucando. Só assim nos sentimos resguardados de verdade para convivermos com quem errou. Afinal, não podemos permitir que o erro aconteça de novo. E de novo, e de novo. Nos preocupamos tanto com a possibilidade do erro voltar a acontecer (e com razão, afinal, foi um erro) que esquecemos de viver. O perdão fácil mata o amor, mata a amizade, aniquila a alegria da convivência, sufoca os sentimentos mais bonitos. Mata porque domina. Mata porque segura. Mata porque desconfia. Mata.

O erro também mata, certamente. Mata a confiança, mata a cumplicidade. Mata o amor? Não sei. Mas começo a desconfiar que sim. Uma leve desconfiança, até porque não conheço alguém que errou apenas poucas vezes na vida. Se vivemos, erramos. Se vivemos, convivemos com erros. Os nossos e os dos outros. Assim, se o erro matasse o amor, não amaríamos mais. Sequer seríamos amados.

Como não queremos deixar de amar e nem de sermos amados, não podemos permitir, então, que o erro mate o amor? Talvez a solução seja uma vida sem erros. Uma solução digna, perfeita. Mas matematicamente impossível. Conclusão exata, a única sem margem de erro. Não errar é impossível. Se conviver com o erro não é uma opção, permaneço com a dúvida: Perdoamos e amamos ou vivemos e matamos o amor?

Quando o erro é nosso, a escolha parece certa: Perdoamos e amamos. Quando o erro é dos outros, tendemos a matar o amor. Matar o amor é mais fácil e menos dolorido. Afinal, podem existir outros amores para substituir aquele que foi assassinado. Perdoar é, de longe, o mais difícil. Mais nobre, talvez, mas infinitamente mais difícil. Até porque AMAR é difícil. Tão difícil que acaba me levando, também, à desconfiança do próprio amor. Sim, porque se o perdão fácil e superficial mata o amor, então o amor não supera tudo. Supera tudo menos o erro? Então não podemos dizer que supera, porque não existe vida sem erro. Mas existe vida sem amor?

Bom, se existe, não é a que desejo. Não é a que eu posso viver. Não é a que eu escolhi viver. Eu escolhi viver com amor, por amor. Não foi a escolha mais fácil, mas foi a minha. A escolha na qual eu acredito. Sem desconfiança.

junho 28, 2011

Escrever um livro, ter um filho, plantar uma árvore - Parte II


Ter um filho. Decisão muito mais complexa. Não basta dedicar algum tempo para plantar, regar e podar. É preciso dedicar a vida e transformar todas as nossas vontades em outras. É preciso deixar uma vida inteira de lado, ainda que por um tempo, para dedicar-se à vida de outra pessoa. Poesia pura, realidade muito diferente.

As decisões são muito mais profundas e impactantes. Estou preparada para sentir todo o desconforto da gravidez e seus sintomas em função de um outro alguém? Sim, porque toda a literatura obrigatória para se ler na gravidez e ao dar à luz somente fala naquele momento mágico de olhar pela primeira vez o rostinho daquela criança e transforma o enjôo matinal e as dores nas costas em provas da fortaleza de uma mulher: Veja como você é forte! Veja o que você consegue fazer! Perceba como é incomparável! Agüente firme!

Ter um filho é a coisa mais contraditória pela qual eu já passei. No momento em que minha primeira filha nasceu, o meu primeiro pensamento foi: Aonde estão as minhas asas? Cadê meus super-poderes? Quando eu começo a ouvir pensamentos e prever acontecimentos? Já consigo fazer um jantar? E um bolo de aniversário? Quantas pessoas vão ficar ao meu lado o tempo todo para que eu possa dar conta de tudo? Aonde é o botão de desligar?Posso desistir disso?

Não vou mentir. Não ouvi sinos tocando, borboletas voando, não senti o coração dela batendo no mesmo compasso que o meu. Me senti muito culpada por não ver nascer em mim aquela mãe idealizada de um minuto para o outro. Sofri muito para amamentar. O maior milagre da natureza para mim não foi amamentar as minhas filhas, mas sim descobrir como elas dormiam bem depois de tomar leite em pó. Nunca acordei feliz da vida às duas da manhã, tendo dormido à uma. E, sinceramente, tenho grandes dúvidas quando ouço uma mãe dizer que antes do filho sentir fome ela já está de prontidão, feliz da vida. Talvez o problema seja comigo, é bem provável.

E algum tempo depois, quando as coisas começam a chegar no lugar novamente, quando as noites já podem ser dormidas, quanto o contato com o mundo exterior retorna, quando a fase das visitas solícitas acaba, você descobre que o pior não passou. Espere a primeira virose. O primeiro tombo. A primeira pirraça sem qualquer motivo. E a segunda. E a terceira. E a quarta. Espere as pessoas te dizendo o que você deve fazer e o que você não deve fazer. Cada um tem um conselho diferente e, muitas vezes, estranho. Vire a criança de ponta a cabeça no berço quando ela não quiser dormir a noite. Coloque uma linha molhada na testa para ela parar de soluçar. Passe azeite na assadura. Agasalhe a criança. Esse choro não é por causa de calor?

E você, sem que ninguém te avisasse com antecedência, se torna outra pessoa. Uma pessoa que não pode comer qualquer coisa, para não dar cólicas no bebê. Uma pessoa que não deve falar alto, que não pode falar besteira. Alguém que tem que assistir o Jornal Nacional em silêncio, que deve gostar de musica clássica, odiar feriado, falar mal dos políticos, achar os programas de TV absurdamente fúteis e maléficos para a sociedade, que não pode estar em casa antes do sol se por nos dias úteis. Alguém que precisa exigir que a casa esteja em ordem, que a alimentação seja saudável. Alguém que começa a se preocupar com que tipo de sol a casa pega. Sol da tarde? Sol da manhã? Acredite, quando isso começar a ser importante para a compra da sua casa, você virou esse alguém. Você virou o alguém que manda tomar banho, escovar os dentes, que pergunta o sobrenome dos amigos, que reclama das roupas, da música, do quarto desarrumado, da toalha em cima da cama. Você cresceu. Cresceu como aquela árvore.  Aquela mesmo, aquela que você plantou para se tornar completo. E o curioso disso tudo é que, quando nos tornamos esta árvore crescida, somos responsáveis únicos pelo crescimento da outra arvorezinha que já nasceu chorando...



O choro é um capítulo a parte. Filhos choram por sede, fome, frio, calor, dor, tédio, cansaço. Choram porque estamos longe. Choram porque estamos muito perto. Choram. Simples assim. Não duvide, o bebê vai chorar. E essa estória de conhecer o choro? Choro de fome, choro de cólica, choro de pirraça  e mais algumas 2.500 variações.  Tudo bem, nós, mães temos a inegável e invariável necessidade de dizer (e mostrar) que conhecemos nossa cria melhor do que ninguém, que o choro somente vai parar quando nós agirmos. A verdade? Do mesmo jeito que o choro começou, ele vai embora. Esteja o bebê com a mãe, com o pai, com a babá ou com a diarista que sequer o conhece. A receita que eu aprendi com as minhas duas filhas é a de ter paciência com o choro. Se a criança não está doente, já se alimentou e está em uma temperatura normal, a única coisa que podemos fazer é esperar. Cantando, embalando, de qualquer forma o choro vai parar.

E é exatamente nessa hora que reconhecemos o valor – ou o tamanho – da paciência que já exigimos de alguém quando éramos nós os protagonistas do choro. Os filhos vão crescendo e a gente vai aprendendo...

Todo mundo diz por aí que ter filhos é a melhor coisa do mundo. Eu sinto, é verdade, um amor incondicional recíproco. Acho que esse é o melhor sentimento do mundo. Indescritível. Indescritível porque ambíguo, contraditório, egoísta, sobrenatural. Chega a ser esquisito. Levante a primeira pedra a mãe que nunca sentiu uma pontada de arrependimento em um domingo a tarde, após um almoço daqueles, quando pensava em se dirigir diretamente para o paraíso cama-travesseiro-edredom-ar condicionado-Tv a cabo, mas foi parada por um incessante pedido: _”Vamos brincar?”. Ou quando planejou uma viagem maravilhosa, e, ao entrar no carro, após a primeira curva, se vê completamente suja em razão do enjôo que acometeu o pequeno?

Os exemplos seriam muitos. Mas nada se compara à realidade que aguarda uma mãe. Encontrar uma babá, atender um milhão de telefonemas durante um dia de trabalho estressante, comprar sapatinhos lindos que serão utilizados uma única vez e que custam o mesmo que aquela peep toe preta que você anda namorando, ouvir a palavra Mãe cinco vezes por minuto, sem qualquer motivo, ser acordada em uma terça-feira de uma semana ocupadíssima no meio da noite para levar o pequeno ao banheiro e, claro, não conseguir dormir mais depois, assistir ao mesmo filme três vezes por noite (no mínimo) e depois não conseguir tirar aquela musiquinha da cabeça por semanas, chegar em casa e encontrar aquele seu estojo edição limitada de maquiagem da Dior em pedaços e, naturalmente, também em cima do edredom branco da sua cama, constatar que o sofá pago em várias vezes está mais sujo do que o tapetinho da entrada, encontrar a parede recém-pintada cheia de rabiscos coloridos e escritas espelhadas, viajar depois de todo mundo por causa de uma apresentação na escola marcada justamente para aquele dia e tantas outras experiências por quais somente as mães e os pais passam.

Esse brinquedo não vem com manual. Ás vezes tenho a nítida impressão de que ter filhos é uma loucura. Eu, por exemplo, enlouqueci duas vezes. Na segunda vez, cheguei a pensar, já na mesa de cirurgia: “Não acredito que fiz isso de novo”. Mas devo confessar que foi bem mais fácil. Eu já sabia que o céu não se abriria para me trazer a luz divina, a sabedoria plena. Eu já sabia o que me aguardava. E mesmo assim, ali eu estava de novo. E novamente, sem manual. Ser mãe poderia exigir curso superior específico, aprovação em exame de proficiência, mestrado e doutorado. Tudo com uma grade curricular ampla. Noções básicas de fisiologia da Grávida (indispensável a presença dos pais nesta disciplina). Teoria da Paciência I. Primeiros Socorros. Introdução à nutrição saudável. Recreação Básica. Recreação Avançada. Teoria da Paciência II. Estudos Avançados de Psicologia. Técnicas Avançadas para Contratação de Auxiliares. Teoria da Paciência III. Teoria Geral do Ouvir e Não Falar. Crianças em espécie. Classificação de Pirraças. Teoria da Paciência IV. Técnicas de Jejum e Autocontrole. Diálogos I. Teoria da Separação. Teoria da Paciência IV. Diálogos II. Tudo isso, é claro, sem levar em consideração a leitura complementar obrigatória.

Sem ilusões, tudo muda. Nosso corpo, nossos horários, nossos prazeres, nosso orçamento, nossos relacionamentos, os lugares que frenquentamos. Sim, porque tenho absoluta certeza que pais trocam qualquer prato preferido por um restaurante que tenha parquinho ou recreadores. Aliás, arrisco dizer que alguns restaurantes e hotéis aumentariam seu faturamento em setenta por cento se pensassem um pouco na necessidade que as mães tem de almoçar com calma de vez em quando.

Então, porque a decisão de ter um filho? Porque somos mais felizes assim? Porque queremos viver “para sempre”? Pela necessidade de sermos incondicionalmente amados? Pelas convenções sociais? Para não ser diferente? Para ter uma razão de viver? Talvez por tudo isso junto, talvez por nenhuma dessas razões.

Questionamentos filosóficos à parte, o fato é que as mulheres precisam ser avisadas do que é ter um filho. Muitas vezes tenho a nítida impressão de que foi feito um pacto secreto – do qual eu não fiz parte – uma espécie de Concílio do Vaticano das mães, nos quais elas definiram determinados critérios e juraram passá-los para frente a qualquer custo. E cumpriram. Como uma sociedade secreta digna de um Best seller do Dan Brown. Após muitas deliberações as mães decidiram que falariam para sempre que ser mãe é a melhor coisa do mundo, que nada se compara ao sorriso de um filho, que todas as mães são felizes, que todas já estão no paraíso. Padecendo, mas estão. 

Com ou sem essa sociedade secreta, ser mãe é muito mais do que a melhor coisa do mundo. É muito mais do que padecer no paraíso. É muito mais do que qualquer desses clichês. Ser mãe é ser de novo, nascer de novo, criar (ou pelo menos tentar) um EU melhorado. Um EU que não é mais sozinho. Um EU que é capaz de qualquer coisa por outro EU. Um EU divino. Imperfeito, mas divino.

junho 16, 2011

Igualdade desigual.

É coisa de mulher mesmo. Com o perdão das feministas de plantão, a igualdade entre os sexos não pode ser exigida. Não pode ser exigida porque não existe. Simples assim. Respeito plenamente  quem possui outra opinião, mas homens e mulheres são, definitivamente, muito, mas muito diferentes. Nas aulas da faculdade, uma das primeiras coisas que aprendi no Curso de Direito foi o Princípio da Igualdade, ou seja, todos são iguais perante a Lei e não pode haver distinção de qualquer natureza. Claro, depois de aprendermos a regra, vem a exceção: Para que exista, realmente, a igualdade, precisamos tratar os iguais com igualdade e os desiguais com desigualdade. Princípio que qualquer aluno do primeiro período do Curso de Direito conhece. Diante disso, mulheres e homens não podem ser tratados da mesma forma. Não mesmo.

Ao pararmos em um posto de gasolina para abastecer o carro hoje pela manhã, meu marido, depois de fazer aquele cálculo que todo homem conhece, me mostrou, cheio de orgulho, um número na calculadora do celular: 8,677859, ao algo parecido. Eu, do alto da minha desigualdade e, não querendo estragar o seu momento que parecia tão glorioso, apenas sorri. Ele continuou dizendo que a média do carro foi muito boa e que, em um outra viagem que fez a média havia sido um outro número enorme desses. E ficou alguns bons minutos falando sobre o que influencia o gasto de combustível, etc, etc, etc. Eu ouvia tudo, mas, ao mesmo tempo, pensava sobre essas diferenças que as pessoas teimam em tentar descaracterizar. Eu dirijo, o combustível acaba, eu abasteço. Acho um absurdo o preço do combustível, reclamo, mas abasteço e continuo. Ele não. Faz todos os cálculos, divide uma coisa pela outra, compara com o último abastecimento, também acha um absurdo o preço do combustível, reclama, mas também abastece e também continua.

E eu, por meu turno, quero a atenção dele para me dizer se aquela cor de base está muito clara, qual sapato fica melhor com aquele vestido, se as luzes no meu cabelo ficaram boas. Vejo claramente que ele pensa: Que luzes? Não vejo nenhuma diferença. Mas ele diz que sim, ficaram boas.

Eu não entendo porque ele precisa comprar todas as ferramentas necessárias (e outras nem tão necessárias assim) para fazer o jardim e lavar o carro, se, normalmente, paga alguém para fazer as duas coisas. Ele não entende porque eu preciso de uma bolsa estruturada de tamanho médio para este inverno. Eu não entendo como ele pode perder horas a fio em frente à televisão assistindo perseguições de carro, ou os acidentes mais trágicos do mundo. Ele não entende para que eu quero um sapato rosa pink e outro rosa claro, para que tanta maquiagem, para que tanto creme. Eu não entendo a preguiça que ele tem de se barbear, ele não entende porque eu tenho preguiça de viajar   (na verdade, de arrumar malas).

Como ele consegue ficar horas conversando sobre os cilindros do carro, turbo, bi-turbo, qual velocidade que o carro alcança em qual tempo? Na minha opinião, se temos um limite de velocidade para ser respeitado no trânsito e na estrada, para que ter um carro que corra mais do que isso?

Como eu consigo ficar horas conversando sobre esmaltes, tons de blush, decoração e um hidratante que mantém a pele hidratada por até 24 horas? Na opinião dele, se eu vou tomar um banho em, no máximo, oito horas e passar novamente um hidratante, para que um que hidrate por 24?

Ele não entende como eu posso gostar tanto (e precisar) de um chocolate. Eu não entendo como ele pode gostar tanto (e precisar) de um vinho. Eu não concordo que ele compre uma moto. Ele não concorda que eu compre outra bolsa. Sim, porque a essa altura, já não quero mais a estruturada marrom de alguns parágrafos atrás. Coisa de mulher. Não acredito que exista alguma mulher no mundo que não goste de ser cuidada, que não goste de receber flores, que não goste de roupa nova, perfume diferente.

Somos iguais? Perante a Lei, sim. Perante o coração um do outro somos completamente diferentes. Entender a diferença é tarefa para poucos, exige desapego, concessão, ou, às vezes, pelo menos um sorriso de cumplicidade, que independe de qualquer nível de compreensão e entendimento.

junho 08, 2011

Escrever um livro, ter um filho, plantar uma árvore.

1.     Já li e ouvi muitas vezes que o ser humano se encontra completo, pronto, acabado quando escreve um livro, tem um filho e planta uma árvore. Não sei quem enumerou estas prioridades, tampouco se elas tem realmente o poder de completar alguém. O fato é que vale a pena avaliá-las. Por que? Talvez pelo mesmo motivo pelo qual se deve acreditar nelas. Nenhum, em especial. Mas às vezes a vida ensina que não é nas coisas especiais que encontramos o maior de nossos desejos, a felicidade plena.

Plantar uma árvore. Talvez o mais simples, talvez o mais significativo. Antes de mais nada precisamos decidir que tipo de árvore plantar, saber se aquela planta sobreviverá às condições climáticas, geográficas e humanas do local escolhido. Saber se aquela árvore poderá oferecer sombra, frutos ou pelo menos uma beleza  a mais naquela paisagem. É preciso também avaliar a melhor época do ano para plantá-la, pois as sementes também tem o seu tempo. Precisamos também avaliar quem serão o seus vizinhos de solo, se aquele meio é propício para o crescimento daquela planta.

Depois de plantada, para que a árvore venha a florescer, é preciso acompanhar. Regar, adubar, proteger. É preciso podar também, mesmo que isso doa no coração de quem plantou. É para o bem da árvore, afinal.

E, mesmo tomando todos estes cuidados, a árvore pode ou não florescer. Talvez porque a semente não era perfeita ou porque negligenciamos algum cuidado importante, ou, ainda, porque uma outra pessoa decidiu que ela não deveria estar ali. Quem sabe a árvore não precisou ser cortada para a passagem de uma estrada? Ou pegou fogo quando atingida por um carro? Por um outro lado, árvores enormes e lindas crescem sem qualquer cuidado, sequer se tem notícia de quem as plantou ou se alguma vez já foram adubadas. É a natureza fazendo a sua parte.

Plantando uma árvore, deixamos, ainda que involuntariamente, uma marca na natureza. Mudamos a paisagem do mundo. Fazemos sombra, mostramos beleza e até alimentamos alguém. Talvez por isso plantar uma árvore seja uma destas três atitudes humanas que não podem ser esquecidas. É a forma da natureza mostrar para o homem os seus caprichos, a sua bondade, a forma de ensinar a ser paciente, a respeitar um ritmo que não seja o nosso, a cuidar e não apenas ser cuidado. E, talvez, apenas talvez, seja a forma da natureza dizer que apesar de todo e qualquer esforço, outras vontades precisam ser respeitadas.

Se eu já plantei uma árvore? Não que eu me lembre. Mas se for para aprender tudo isso, devo conseguir a semente amanhã mesmo.

maio 17, 2011

AVISO.

A Lua Cheia no céu. O que de mais bonito eu vi hoje. Senti vontade de ligar para muita gente, enviar torpedos, mensagens de voz, postar no facebook, twitter, falar com as pessoas na rua: Olhem que lua linda! Como tantas vezes deixei passar. Não deveria. Estava realmente divino.

Lá no alto, cheia, imponente. Mas ao mesmo tempo parecia tão perto. Diante de todas as luzes artificiais da cidade, ela se destacava. Ela mostrava o seu lugar. Às vezes até tentava se esconder atrás de uma nuvem, mas logo reaparecia, ainda mais bonita. Parecia ter ido retocar a maquiagem ou descansar a sua beleza. Me seguia de longe, mas sem me perder de vista. E sem que eu a perdesse também. Me trouxe até em casa, como um anjo da guarda. Parecia realmente um aviso. Um aviso de Deus: "Eu continuo por aqui, e continuarei para sempre".  Hoje, a Lua me reforçou essa certeza.

maio 04, 2011

Desejo bom.

Foi só ler no facebook da Silmara - uma fofa que eu adoro ler e que parece que conhece a alma da gente - que eu me apaixonei. Não paro de pensar um minuto sequer no que eu faria se tivesse com um desses na mão. Penso e começo a viajar. Viajo no tempo e no espaço, entre lembranças, dores e amores, idas e vindas, perguntas e respostas, sorrisos e mais sorrisos.

O Jardim Branco - design de cadernos e livros imaginários. Os títulos me fizeram desejar um de cada. E eu fiquei mesmo, pensando o que escreveria em cada um deles. Na minha cabeça, quase todas as páginas já foram escritas. Certamente teria que correr para o volume II da grande maioria deles.

O livro das cartas não escritas. Eu sempre gostei de escrever cartas e sempre o fiz com muita frequência. Mas, claro, muitas delas não foram enviadas e algumas, sequer escritas. Certamente escreveria uma carta para cada uma das minhas filhas, escrevendo tudo o que desejaria que elas soubessem mesmo que eu não tenha a chance de falar. Escreveria também para minha avó, o que gostaria que ela tivesse lido há alguns anos atrás. Escreveria para alguns familiares também, para alguns amigos, para minha mãe e para o meu amor. Em cada uma delas, um pedaço de mim estaria junto com as palavras. Talvez ainda haja tempo para escrever todas elas.

O livro da saudade. Memórias deliciosas, verões em Guarapari, o cheiro do meu pai, os almoços de domingo na casa da minha avó, anos de colégio Marista, lembranças boas da Escola Crescer, amigos que nunca mais vi. Saudades que nunca me deixarão.

O livro das coisas leves. Coisa mais deliciosa escrever sobre coisas leves que me dão prazer e que me fazem mais leve também. Beijo de filha, séries de TV, cheiro de lençol limpo, sorriso de um desconhecido e mais tantas outras coisas que, de tão leves, viram poesia através de palavras. O livro do esquecimento. Neste eu colocaria tudo o que quero esquecer e deixaria que a cada derrame de palavras, os sentimentos derramassem também, não permitindo que nada fizesse com que eu parasse de sonhar, de querer, de fazer e de amar.

O livro de estar longe. Sabe aquela vontade de falar algo com alguém ou sobre algo quando estamos longe? É essa vontade mesmo que eu expressaria nele. Para que a proximidade nunca permitisse que as palavras se fizessem desnecessárias.

O livro da passagem dos dias. O livro das viagens. O livro dos momentos tristes. O livro de espera. O que eu espero? Pelo que quero esperar? Quais as minhas esperas que já chegaram e quais aquelas que não chegaram e eu agradeço a Deus por isso. O livro de guardar o que acaba. Sim, porque mesmo que acabe, poderia eternizar o que pretendesse neste livro. Tantos outros livros. Todos em branco. Em branco como o próximo dia, como o "daqui a pouco". Em branco, mas cheio de inspirações, cheios de expectativas, de vontade.

Coisa mais linda esse Jardim de livros brancos que faz florescer tanta coisa na minha cabeça e no meu coração.

abril 26, 2011

Espelho, espelho meu.

Uma das melhores sensações que eu conheço é a sensação de voltar para casa. Não importa quanto tempo fico fora, como ou com quem, mas quando volto para casa, é como se eu me conhecesse melhor. É a sensação que tenho quando estamos juntas. Sensação de voltar para casa, de aconchego, de conforto, de confiança, de alivio.

Somos Renatas que se entendem quase como se fossem a mesma pessoa, como se os sentimentos de uma fossem claros como água para a outra. Um espelho, um reflexo, uma identidade.

Talvez essa sensação de volta para casa seja porque logo que voltei a morar em Colatina, após nove anos em outra cidade, ela tenha sido a minha primeira amiga. Morávamos uma ao lado da outra e passávamos o dia quase todo juntas. Ela brinca dizendo que comprava a minha companhia em algumas ocasiões com picolés e chocolates. Não posso dizer que é mentira, mas a maior verdade de todas é que NADA compra o tempo que passamos juntas e o amor que tenho por ela. NADA.

Crescemos juntas, com finais de semana na fazenda, brigas de irmãos, conversas intermináveis na frente de casa, passeios de  bicicletacom direito a assalto, idas ao tercinho e à Perseverança da Catedral – que na época era Matriz - , planos profissionais para o futuro – que foram completamente modificados – e tudo mais o que tínhamos direito. Porque éramos vizinhas? Não. Ela se mudou de casa. Ela se mudou de cidade. Ela se mudou de país. E, mesmo assim, continuamos próximas, como se apenas alguns metros nos separassem e eu ainda pudesse sair de casa carregando um colchão já arrumado, para dormir na casa dela.

Hoje somos Renatas adultas, mas continuamos sendo um espelho. Pelo menos, ela é um espelho para mim. Um espelho através do qual eu vejo muito mais do que qualquer outro. Um espelho que sente, que entende, que espera, que ajuda, que divide, que cuida, que se preocupa. Um espelho que tem medo, ansiedade, angústia assim como eu, mas que celebra uma vitória ou um momento qualquer da vida como nenhum outro. Um espelho de corpo inteiro e de alma toda, que pode ter o tamanho de uma dificuldade ou caber dentro da bolsa. Um espelho que carrega uma história e que faz parte do presente. Do MEU presente. Um espelho lindo, que merece muito mais do que uma casa com varanda e quintal. Um espelho para quem eu desejo tudo o que desejo para mim mesma e com a mesma intensidade. Um espelho que eu quero para a vida toda. Em espelho que eu tenho certeza que vai ter sempre um lugarzinho para o meu colchão arrumado porque o seu coração continua vizinho do meu.






abril 14, 2011

Para guardar pra sempre.

No ano em que fiz quinze anos, ganhei de presente uma viagem para a Disney. Eu e várias amigas minhas da mesma idade. Ficamos dezoito dias entre Orlando e Miami, aproveitando tudo, achando tudo maravilhoso e, claro, trazendo malas cheias de bichos de pelúcia. Na época, ir na Disney e não trazer bichinhos de pelúcia era quase um pecado mortal. Era a época do Nintendo, de aparelhos de CD e fita cassete regravável. O meu "CD Player" tinha controle remoto e era a coisa mais moderna em que se podia pensar na época. Perfume Azzaro não podia faltar na bagagem, assim como CD's do Pink Floyd, U2 e de uma banda que eu acho que se chamava Technotronic, ou algo semelhante.

Muitas coisas me marcaram muito naquela viagem. Uma delas foi perceber no passaporte de uma menina chamada Fernanda, que também comemorava seus quinze anos, alguns carimbos anteriores. Aquela não era a sua primeira viagem internacional. Entre outras, ela já havia estado na Disney, alguns anos antes, com os pais e o irmão. Naquela hora, eu achei que havia encontrado a pessoa mais feliz do mundo. Ela estava vivendo aquilo tudo com as amigas, mas já tinha vivido antes, com a família. Achei o máximo. Não sei que fim levou a Fernanda, nem mesmo sei se ela sabe que o passaporte carimbado dela causou tanto impacto assim na vida de alguém, mas o fato é que eu, por muito tempo, achei que ela sim, era uma pessoa feliz, realizada. Viagem internacional, no meu universo, só acontecia aos quinze anos. Mas o meu universo mudou. Hoje, não acho que a felicidade dependa de uma viagem internacional, seja aos quinze, aos trinta, aos cinco ou aos cinquenta anoa. Bichos de Pelúcia não entrariam em minha bagagem, o meu CD Player super moderno virou um monstro pré-histórico sem lugar, minhas filhas sequer sabem o que é uma fita cassete regravável e nem sei se vendem mais Azarro...

O tempo passou. De forma implacável mas também deliciosa. Gratificante. Das fitas regraváveis ao IPod Nano, oportunidades foram aparecendo, responsabilidades foram surgindo, e, no meio de tudo isso, casamento, filhas e mais tantas outras coisas.

No meio desse cenário novo que a vida criou para mim - ou que eu criei para a vida, talvez - fomos à Disney com as crianças. Sem esperar quinze anos de ninguém, sem planejar demais, sem nada de especial para comemorar. Apenas o fato de estarmos juntos e podermos curtir essa fantasia toda de uma forma completamente diferente. E ainda mais deliciosa.

CDs, perfumes, video games, e tantas outras coisas deram lugar a coroas, varinhas de condão e até mesmo a fantasias de princesas. Horas de shopping foram substituídas por filas nos parques para que elas pudessem ter o autógrafo e as fotos de seus personagens preferidos. Idas repetidas nas montanhas russas mais radicais foram substituídas por estórias, shows musicais, atrações encantadoras.

E assim eu aprendi o que é magia de verdade. É ver nos olhos de uma criança a alegria por ver o Alladin e a Jasmin ao seu lado, se preocupar com a pequena sereia Ariel fora da água, se esconder atrás da Bela com medo das unhas enormes da Fera. É dizer que as princesas, naquela noite após o desfile, fariam uma festa do pijama no Castelo da Cinderela, pois estavam todas ali. É tentar bater na madrasta malvada que aparece no filme 4D. É cantar e dançar em qualquer oportunidade. Perguntar se as princesas também comem aquela pizza. É achar o cabelo da Princesa Aurora lindo e querer deixar crescer para usar igual. É celebrar cada cantinho, cada flor, cada jardim, cada luz, cada fogo de artifício. É dar significado para tudo e não se preocupar com o significado de nada ao mesmo tempo. É entender  que é ser criança e voltar a sê-lo de novo.

Voltamos de malas cheias, sim, mas mais cheio estava o coração. O passaporte foi carimbado sim, mas a maior marca que ficou foi o sorriso que aparece no rosto de cada uma delas quando lembramos do que passamos juntos. Vivemos um sonho sim, mas o melhor de tudo, para guardar para sempre, foi voltar para a realidade acreditando, de verdade, em magia.








abril 07, 2011

Uma Árvore Para Mim.

Foi promessa este ano. Promessa para cada uma delas. Um texto no dia do aniversário de cada uma. Cada uma das minhas amigas queridas que fazem parte da minha vida. Cada uma do seu jeito, com a sua intensidade, com a sua parte que me toca. Elas pediram e eu estou adorando cumprir esta promessa.

E hoje é o dia da minha árvore.

Das minhas amizades mais próximas, talvez ela seja a mais nova. Mas eu nunca vou poder dizer menos intensa. Sabe quando uma alma gosta da outra? Pois é. A minha alma gosta da dela. De verdade. Ela vive dizendo que tem muitos defeitos. Eu vejo tantas qualidades que ela nem imagina. Ela fala que é estourada e brigona. Tudo o que eu queria ser e não sou. Talvez ela nem saiba, mas me ensinou muita coisa. Me ajudou a expulsar a Júlia de vez (piada interna), me ensinou a planejar menos e aproveitar mais, me ensinou a comer alface e rúcula com molho de iogurte e me ensinou a tomar champagne neste carnaval. E eu, que nunca gostei de beber nada, achei o máximo me sentir tão diferente depois de umas tacinhas. Nada demais, mas ela, a minha árvore, ficou ali, fingindo que também bebia, só para ver se eu ia me comportar direitinho...Coisa de amiga mesmo, não é? Ela não quer ver o circo pegar fogo. Se for preciso, veste roupa de bombeiro e ajuda a apagá-lo. Mesmo que tenha que descer do salto para isso.

Por que árvore? O Apy (filho mais novo dela) se pendura em seu pescoço como um macaquinho e diz que ela é a sua árvore. Ah, Apy! Me perdoa, mas eu também adoro me pendurar no pescoço dela. Com champagne ou sem champagne. Já tomei essa árvore para mim também...E adoro ficar perto dela. Adoro as nossas conversas sobre maquiagem, esmaltes e sapatos, algumas das paixões que nos unem. Somos tão fúteis quando queremos...Ou quando precisamos...

Minha árvore tem um coração enorme. Ela até divide os bombons diet que ganha da Cacau Show! Ela também me surpreende muito. Eu sempre achei que ela fosse aquela "dona do pedaço"que decide, não sofre, não chora, aproveita a vida e tem muitos amigos, mas não aceita qualquer um. Mas, vendo essa árvore mais de perto, hoje percebo que ela é muito disso sim, mas é, antes de qualquer coisa, puro coração. Puro sentimento. Minha árvore vira manteiga derretida fácil, fácil. Ela é doce, meiga e se importa com cada palavra que é dita para ela. Tudo isso não aparece logo, não...É como aquela árvore que parece pequena, mas tem raízes enormes e fortes, impossíveis de serem arrancadas. As raízes dela são assim. Cheias de doçura, de cuidado, de preocupação, de proteção, de cumplicidade verdadeira e também de uma fragilidade quase infantil, ingênua, que poucas pessoas conseguem manter e que a tornam tão especial. Esse é o tesouro dela. Não é qualquer um que ela deixa ver, não. Eu não sei se ela me deixou ver ou se eu fui enxerida e descobri, mas o fato é que agora não tem mais jeito. Essa árvore já é parte da paisagem que eu criei para mim e eu sou muito orgulhosa disso.

Minha árvore, saiba que você é muito querida, sua sombra já se tornou necessária para mim e saiba também que, se depender de mim, você terá tudo o que precisa para continuar sendo a árvore que o Apy me emprestou - mesmo sem saber! - sol, água, chuva, poda, noite, dia, bombons diet da cacau show, borbulhas, blushes da Nars e da Guerlain, Primers e Lápis de Olho da Urban Decay, Sombras Chanel, Duda Molinos, Pincéis da M.A.C, Studio Fix na cor certa, Iluminadores da Benefit, Máscaras da Dior e da Maybelline, Batons Chanel, Illamasqua, Corretivos da YSL, enfim, tudo o que for necessário para te fazer feliz e te ter por perto. Muitos beijos, viu?

fevereiro 28, 2011

Um Amor de Porco-Espinho.


Há quase 25 anos eu convivo quase diariamente com um porco-espinho. Um porco-espinho que já perdeu, ao longo destes anos todos, muitos dos seus espinhos, tanto que, muitas vezes, chega a parecer um daqueles ursinhos carinhosos que dão vontade da gente abraçar e levar para sempre consigo. Mas, uma vez porco-espinho, sempre porco espinho. E quer saber? Graças a Deus. Graças a Deus que o meu porco-espinho se mantém assim. É que o porco-espinho, na verdade, se utiliza dos seus espinhos apenas para se defender e defender os seus. Então, eu me sinto protegida perto do meu. Quer dizer, da minha. É, meu porco-espinho é fêmea. Fêmea que, apesar dos espinhos, é sensível e sonhadora. Nunca perde aquela paixão que move as adolescentes de quatorze anos que nós duas já fomos um dia. Uma amizade meio inusitada, porque, normalmente, porcos-espinho não são amigos de formigas. Só que a espécie animal não faz a menor diferença quando existe amor de verdade. Aí, começamos a perceber que porcos-espinho e formigas são muito mais parecidos do que se pode imaginar. Pelo menos no nosso caso. Somos tão diferentes e tão iguais ao mesmo tempo. Nos entendemos só com um olhar  ou com meia-palavra. Mas nos entendemos mesmo. Sempre foi assim. Já brigamos algumas vezes. Eu me lembro de três, na verdade. Na primeira, tínhamos aqueles quatorze anos já falados. Nem me lembro do motivo, mas me lembro que ela deixou na portaria do meu prédio uma arvorezinha de papel que, em contato com a água, florescia, com um cartão maravilhoso. Na segunda, já namorávamos com nossos maridos, já fazíamos faculdade. Eu também não me lembro do motivo e nem de como tudo terminou. Nem ela lembraria. Aliás, a memória não é o forte desse porco-espinho.

Na terceira vez, e mais dolorida, já tínhamos nossas filhas, nossas casas. A proximidade sempre foi tão grande entre nós que nos perdemos no nosso próprio espaço, era difícil entender aonde terminava o meu e começava o dela, e vice-versa. Assim também como o espaço de nossas filhas e nossos maridos. Mas passou também, claro. Não tinha como não passar. Eu não podia ficar sem o meu porco-espinho. Acho que também ela não podia ficar sem a sua formiga. Sempre temos o que aprender uma com a outra. Mesmo depois de 25 anos de contato, certamente mais de 5.000 horas no telefone (boa parte dessas horas durante os tão falados quatorze anos) e mais de 2.000 e-mails trocados. Nossas conversas nunca acabam. Nem as nossas risadas.

E o melhor de tudo isso é que rimos mais é de nós mesmas, de tantas coisas que já vivemos juntas. Temos gírias e expressões que poucos entendem. Descobrimos tantas coisas juntas, que acho que poderíamos escrever um livro só com histórias pelas quais passamos. Me lembro exatamente do dia em que ela chegou em minha casa e me acordou, com uma animação que só uma chocólatra entende: “Rê, acorda! Encontrei a caixa da vida!!!!!!!” E eu acordei, extremamente curiosa, para ver pela primeira vez a nova caixa de especialidades da Nestlé. Não sei quantas latas de leite condensado já acompanharam as nossas confidências, quantos litros de sorvete, quantos litros de coca-cola. Quando soubemos que eu não poderia comer chocolate amamentando, logo demos um jeito. Ela comia a casquinha e eu o recheio do bombom Serenata.

É claro que sofremos as conseqüências de todos esses pecados cometidos  e, hoje, também juntas e também morrendo de rir, visitamos quinzenalmente uma nutricionista. Não poderia ser diferente, afinal, até uma fonte de chocolate nós compramos “em sociedade”.

Entre chocolates e dietas, choros e risadas, ouvindo Lulu Santos, Lobão, Pink Floyd, Fleetwood Mac, fomos crescendo. Belo Horizonte, Ouro-Preto, Guarapari, Nova Almeida, Domingos Martins, Vitória, Prado, Porto Seguro, Cachoeira da Fumaça, Rio de Janeiro, Balneário Camboriú, Blumenau, todos estes lugares e mais alguns já testemunharam as nossas risadas. Recentemente, até Orlando e Miami. Sonho realizado para nós duas. Ela chorou como uma criança assistindo ao show Illuminations no Epcot. Aquele choro de alegria mesmo, de verdade. A mesma alegria que eu sinto quando lembro de tudo isso e, mais ainda, quando sei que o meu Porco-Espinho está aqui pertinho, há apenas três ruas de distância, quando sei que amanhã pegarei as nossas filhas na escola, quando sei que se não nos encontrarmos amanhã, certamente nos falaremos no telefone, por e-mail ou até mesmo através do Google Talk – ou tudo isso junto - , quando sei que no fim de semana, invariavelmente, estaremos juntas, na minha casa ou na casa dela, com nossos maridos e filhas, com nossas risadas, nossos churrascos e nossos chocolates. É, hoje os chocolates são diet. Os refrigerantes também. Mas outras coisas nunca vão mudar, eu tenho certeza. É como estava escrito em uma plaquinha de madeira que ela trouxe para mim de uma viagem: Amigo é um irmão que a gente escolhe depois que nasce. É verdade. Acho que escolhemos uma a outra. Somos irmãs mesmo. De alma.

fevereiro 21, 2011

Aula de amor.

Hoje eu levei a minha pequena Elisa para a natação. Levei hoje porque a super-babá-Adelaide precisou ir ao médico. Claro, é preciso um motivo para levar a filha, no meio da tarde, para a natação. Ainda que o processo todo não leve uma hora. Mas, afinal, minha posição de mulher-moderna não permite que eu esteja, no meio da tarde de uma segunda-feira, em um ginásio coberto para acompanhar os progressos aquáticos da minha segunda filha. Confesso que, durante a aula, chequei várias vezes os meus e-mails,  atendi a umas cinco ligações, fiz várias listas do que havia por fazer, mas, ainda assim, eu pude observá-la, ganhando cada vez mais confiança naquela piscina enorme e, claro, se divertindo muito.

Ela já estava usando a bóia em apenas um braço, progresso que eu não vi acontecer. Ela já sabe pular, nadar de costas, encontrar objetos na água, nadar com a prancha, com o tapete, com o espaguete de borracha. Ela já sabe fazer tudo isso sozinha. Eu era quem não sabia das coisas ali. Eu era quem não sabia aonde ficava o banheiro feminino, eu era quem não sabia como ligar o chuveiro. E, claro, não precisei chegar nem perto enquanto ela lavava perfeitamente os cabelos com shampoo e condicionador após a aula. Só assisti. Assisti aquela pequeneza toda enfrentando a piscina sem qualquer medo, sem qualquer sentimento de impossibilidade, sem qualquer dificuldade.

Apenas assisti quando ela pedia ajuda à professora para subir na borda da piscina, com a intimidade de quem conhece a anos aquilo que está fazendo.

Segunda-feira, às três da tarde, e eu não estava em meio a prazos, petições e reuniões. Eu estava recebendo um tchauzinho a cada vez que ela chegava à borda da piscina. Eu estava observando todos os sorrisos e toda a vontade de aprender e conquistar que ela demonstrava. Eu estava aprendendo com aquela pequenina de biquini vermelho e touca prateada a me jogar mais na piscina, sem me preocupar com o medo. Eu estava aprendendo a não deixar de tentar.

Eu adorei a minha aula de natação, a seco. Adorei a minha aula de coragem. Adorei a minha aula de superação. Mas, o que mais adorei mesmo, foi enrolá-la junto a mim, na toalha após o banho. Se fiquei toda molhada? É claro que sim. Mas foi um banho de felicidade e uma aula de amor.

fevereiro 15, 2011

Terapia.

Sempre achei que me encontrava na escrita. Que escrevendo, conseguia me conhecer melhor e entender todas as armadilhas da minha personalidade. Na verdade continuo achando. Escrever sempre foi uma terapia para mim. Talvez por isso seja tão apaixonada por cadernos, canetas e blocos. Já comecei vários diários e já tentei me expressar de várias formas. Criei um caderno de ressentimentos, um caderno de contentamentos, comecei a escrever a minha vida inteira em inglês, tentei poesias, crônicas, um caderno de orações e tudo o que amontoasse palavras e que me desse prazer de ler depois. Muitos destes cadernos ainda existem e me fazem muito bem. A maioria nunca foi lida, não que eu saiba. Não precisava. Eu gosto de derramar palavras, vê-las soltas ou em conjunto, pensar do significado de cada uma, na forma como soam. Algumas palavras me fazem bem só por existirem, mesmo destacadas de seu significado. Prefiro escrevê-las do que pronunciá-las. Escrevo melhor do que falo. Escrevendo, me exponho. Falando, acho que me escondo. Não sei porquê ou de quê, mas me escondo. E esconder não é uma palavra dessas que me fazem bem.

A necessidade de escrever sempre foi mais presente do que a de falar e me peguei pensando nisso agora. Quando escrevo, posso ler ou não. Posso escolher quando ler, como ler, com quem ler. Quando falo, eu me escuto. Necessariamente. Não tenho escolha, me ouço do início ao fim. Será por isso o silêncio? Será por isso a necessidade de escrever?

Descobri a pouco tempo a necessidade de falar. Talvez tenha sido uma descoberta forçada, mas descoberta é sempre uma palavra que me faz bem. Descobri que as palavras também ficam bonitas quando pronunciadas e que escutar a mim mesma também é uma necessidade.

Não paro de escrever. Escrever virou mania, hobby, desejo, hábito, vontade. Escrever sempre me fará bem. Mas as palavras escritas precisarão dividir espaço com as pronunciadas. Sem ciúmes. Sem disputa. A palavra escrita vai ser sempre mais bela aos meus olhos, eu acho. Coisa de personalidade, talvez. Mas eu descobri que quero falar também, nem que seja apenas para mim mesma. E elas, as palavras, continuarão me encantando. Sempre. Cada uma com seu som, sua escrita, seu significado. Juntas ou separadas. Palavras que quero para mim, para sempre.

VERDADE                               SORRISO                     TRAVESSEIRO              BRISA    

FILHA                          FRESCOR                      ESTRELA        CORAÇÃO           AMIGO

NUVEM          CARINHO            ENFIM         SORTE         CHOCOLATE        CHEIRO    

COLORIDO              MARIDO          FLORIDO            AMANHECER             CLAREZA

ESTABELECER         ENQUANTO         SONHO     VIAGEM     PARAÍSO         VONTADE

CHUVA            MÚSICA          OLHOS            PAIXÃO       SOSSEGO           AMOR         FÉ

SENTIMENTO          BEIJO                  VESTIDO           ONDA           LUAR           PRINCÍPIO


Só para citar algumas...

fevereiro 02, 2011

A Dor do Crescimento

Laura: _ Mãe, estou sentindo uma dor nas minhas pernas desde hoje de manhã na escola...

Eu:_ Fez algum exercício diferente, filha?

Laura:_ Não, nada. Começou a doer assim, de repente.

Eu:_ Talvez seja a "dor  do crescimento", filha. Já ouvi dizer que ela existe...

Laura: _ Dor do crescimento, mãe??? Como assim?

Eu:_ É. Uma vez um médico me disse que quando a criança está crescendo, pode sentir algumas dores por causa disso, mas que é normal.

Laura:_ Mãe, é verdade?

Eu: _ É, Laura. Amanhã, se continuar doendo quando você acordar, me fale. Mamãe te leva ao médico.

Laura:_ Tá. Boa Noite, mãe. Te amo. Rosas no seu travesseiro.

Eu:_ Boa Noite, filha. Te amo também. Rosas no seu travesseiro.

Eu, sozinha: Crescer dói mesmo. Em todos os sentidos. E, nesse caso, Laura, acaba doendo mais em mim...

janeiro 25, 2011

Um lado negro, para variar.


Estou cansada de mim mesma. Estou cansada das minhas vergonhas, das minhas inseguranças, das minhas limitações, das minhas mentiras, das minhas verdades, dos meu orgulhos, das minhas esperanças. Cansei da maneira como me expresso, da maneira como ando, da maneira como sento. Cansei de ouvir. Cansei de entender. Cansei de esperar. Cansei de não escolher que música ouvir. Cansei de falar que eu não gosto de big brother Brasil.

Cansei de dizer que odeio feriado, que eles atrapalham a minha vida. Cansei de compreender as razões das pessoas por qualquer ângulo que elas demonstrem. Cansei de fingir pudores ou prazeres, mágoas ou impressões. Cansei de não dizer não, cansei de fazer o que não posso. Cansei de me calar. Cansei de pedir desculpas por ter defeitos, cansei de esconder qualidades por modéstia. Cansei de não chorar pelo leite derramado. Cansei de sofrer escondido. Cansei de não reclamar e de não pedir ajuda. Cansei do sim. Cansei do talvez.

Cansei de freqüentar lugares que não gosto. Cansei de suportar pessoas que não me acrescentam. Cansei de fazer o meu corpo agüentar o peso das minhas emoções reprimidas. Cansei de achar que alguém só é alguém se gostar de Chico Buarque. Cansei de afirmar sem dúvidas, cansei de precisar saber.

Cansei de dizer que não me importo, que tanto faz.

Cansei. Cansei de procurar ver o melhor em tudo, de parecer uma Pollyanna menina inveterada, otimista ao extremo, sempre esperando a tempestade passar para que o sol apareça ainda mais belo e forte. Cansei de sorrir. De mostrar uma alegria e uma bondade que ninguém tem, nem eu. Acho que muito menos eu. Cansei de funcionar como pára-raio das minhas relações. Em casa, no trabalho, no casamento. Cansei. Cansei de esperar quietinha que as coisas se resolvam, sem falar nada, para não piorar ainda mais a situação. Ou de agir sempre, tentando resolver assuntos que não são só meus. Às vezes sequer são meus em parte. Cansei de tentar segurar as coisas sozinhas para que o “mundo” não tenha mais um problema para resolver. Quer saber? Estou com vontade de agora ser o problema do mundo. Além da dengue, da crise, da fome, do desemprego, das enchentes e das calhordices do senado (com letra minúscula mesmo, porque ele não merece ser chamado de substantivo próprio), o “mundo” vai ter que se preocupar comigo também. Não resolvo mais nada na vida sozinha. O “mundo” vai ter que me ajudar. Ou pelo menos tentar. Assim como eu fiz até hoje.

É isso. Um lado negro, para variar. Ou não.

janeiro 18, 2011

Uma Pedra no Meu Sapato.

Alguma coisa me incomodava muito, e eu não sabia exatamente o que era. Quando consegui parar, percebi que havia, de fato, uma pedra no meu sapato. Sem qualquer hesitação, tirei o sapato que calçava meu pé direito e, rapidamente, retirei dali o objeto da minha insatisfação. Simples assim. Incomodou, localizei, retirei e continuei andando, devidamente aliviada.

A pedra saiu, mas eu coninuei pensando. Quantas vezes utilizei essa expressão "pedra no sapato" ? Que eu me lembre, foi a primeira vez que havia mesmo uma pedra no meu sapato, mas ao longo da vida, me lembro de ter utilizado esta expressão muitas vezes.

Uma menina que implicava comigo em uma Colônia de Férias foi uma pedra no meu sapato. Meu irmão, na época da adolescência, foi uma pedra no meu sapato. O fantasma dos quilos a mais sempre foi uma pedra, das grandes. A minha dissertação de mestrado foi uma pedra no meu sapato. A conta bancária no vermelho também. A compulsão por chocolate e a aversão a frutas e verduras. Dizer NÃO talvez tenha sido (se seja, até hoje) a minha maior pedra.

Algumas dessas pedras foram localizadas, outras não. Algumas foram retiradas. Mas o incômodo continua. Várias pedras continuam no meu sapato. Várias. Algumas, eu poderia ter tirado a tempo e não tirei. Talvez porque não as tenha identificado, talvez porque era incômodo demais abaixar para retirá-las. Outras, eu nem faço ideia do tamanho ou do peso, mas sei que existem, porque incomodam. Seria tão simples se pudéssemos localizar estas pedras que vão se acumulando ao longo da vida e, com a simples retirada de um sapato, jogá-las para fora, arrremesá-las longe.

Infelizmente, essas pedras não são como aquela que eu encontrei no meu sapato. Essas criam raízes. Crescem. São como seres vivos. Se alimentam da força que encontram em nossos sapatos. Se reproduzem. Até morrem, mas só com o passar do tempo ou quando são arremessadas. Sempre contra a própria vontade delas. Elas querem continuar ali, dentro do sapato, ao abrigo da luz e calor, com alimento de qualidade à disposição.

Dá trabalho arremessar essas pedras para longe. Algumas são pesadas demais e, muitas vezes, até precisamos de ajuda. Outras, apesar de leves, são sorrateiras, se escondem para fugir do arremesso. Existem até mesmo aquelas que são macias, e, a princípio, nem incomodam, mas com o passar do tempo, vamos  nos dando conta de que o lugar delas não é ali, e de que a vida poderia ser bem melhor sem elas. Algumas, ainda, passam a vida toda sem serem vistas pelo dono do sapato que só as conhece quando alguém as vê por ele.

Apesar de podermos viver uma vida inteira com uma pedra no sapato, é preciso entender que a vida sem ela será infinitamente mais confortável. Ainda que seja necessário parar um pouco para abaixar e retirá-la.