agosto 05, 2014

Um Jogador de Baralho Flamenguista.

Essa época do ano me leva sempre a agradecer. Agradecer o pai que eu tive, mesmo que o tenha tido por apenas oito anos. Às vezes me pego pensando em quantas coisas aprendi com ele, em tão pouco tempo. Talvez seja aquela ideia que a vida nos dá de  tornar heróis aqueles que já se foram. Eles não tem mais tempo de contradizer as nossas expectativas, tampouco de mostrar um outro lado que ainda não conhecemos. Tudo que era para ter sido, já foi. Ou talvez seja pela lente de amor e admiração que cobre os olhos de toda filha ao enxergar o pai. Ou ainda, talvez ele realmente foi aquela figura extraordinária da qual eu me lembro, e, por isso, tenha sido levado dessa vida tão estranha mais cedo.

Uma figura mansa, mas firme. Uma figura que inventava apelidos e fumava Charm. Que usava suéter azul marinho com gola V e cantarolava Beth Carvalho. Que brincava com a mesma facilidade que falava sério e tratava minha mãe com uma delicadeza e um amor que eu não saberia dizer que vi em outro casal. Generoso, espirituoso, grisalho desde muito cedo. Um jogador de baralho que eu nunca vi perder. Só o Flamengo lhe tirava a calma. Uma letra linda, que enfeitou as capas dos meus cadernos até a segunda série. Comprou um vídeo cassete quando grande parte dos aparelhos de TV ainda eram em preto e branco. Fez do vídeo game um companheiro para a solidão da doença que o consumiu. Nem doente parecia triste. Já em sua última vez no hospital, recebeu a mim e ao meu irmão com bombons. 

Uma figura que me ensinou a paciência. No baralho e na vida. Me ensinou que a maioria dos problemas da vida se resolve com boa-vontade e bom-humor. Me ensinou que a vida pode ser leve, que sorrisos e gentileza transformam o ser-humano. Me ensinou que precisamos cultivar o que nos faz bem.  Me ensinou a oração de São Francisco, que, até hoje, me conforta. Me ensinou que, às vezes, não há nada o que fazer, a não ser aceitar. E que, mesmo nessas horas, a gente ainda tem muito o que agradecer.

Um comentário:

Nina disse...

Ownnnnn que texto tao bonitinho! Nao lembrava que tu eras tao pequenininha qd ele se foi, Rê :-( Só lembro da roupa azul e do cabelo liso do desenho.

sei como é sentir falta de pai, é uma dor estranha ne? falta sempre alguma coisa, que a gente nao sabe ao certo definir...a mae qd falta, a gente sabe exatamente o porquê e aonde, mas pai,é uma falta que nao faz mt sentido. sei lá, pra mim é assim. falta de algo que nao sabemos exatamente o que é.

um bj pra ti e pras tuas filhas que devem estar enoorrrrmessss