Quando criança, sempre quis ter uma coleção. Achava lindo quem colecionava objetos e mantinha tudo na mais perfeita ordem para satisfazer o seu próprio orgulho. Cheguei a começar algumas. Figurinhas, chaveiros,borrachas de cheiro, aquelas mini-garrafas de coca-cola que vinham em um micro engradado vermelho.
A maior de todas elas foi, sem dúvida, a minha coleção de papéis de carta. Pastas e mais pastas pretas de plástico com os papéis arrumados com o respectivo envelope e, às vezes, até com um adesivo para fechar o envelope que nunca seria usado. Trocava os papéis de carta repetidos com as amigas, vibrava quando encontrava algum modelo diferente, transparente, brilhoso e até cheiroso. Ficava horas e horas colocando os papéis na pasta e escolhendo - eu mesma, concorrente e júri - o mais bonito.
Com o tempo, os papéis foram se perdendo, amarelando, rasgando. Nem das pastas eu tenho mais notícia. E nem poderia, considerando a crise alérgica que me causariam. Mas chego a me arrepender de não ter escrito naqueles papéis tão lindos, de não ter distribuído aquelas cartas não escritas, de ter deixado tudo perecer em função do excesso de zelo do qual eu cheguei a me orgulhar.
Continuo gostando de papéis, mesmo os coloridos, brilhantes e cheirosos, apesar de não ter mais oito anos e apesar de viver a era digital em todo o seu máximo conceito. Mas hoje não guardo. Não coleciono. Escrevo em todos. Nem que seja para mim mesma. Escrevo com o mesmo capricho que os guardava naquela época.
Colecionar objetos já não me fascina e me traz até uma certa fobia. Afinal, vivemos um tempo de falta de espaço e de tempo, duas das principais coisas que um colecionador precisa ter. Mas, como sempre acabamos por guardar traços da infância durante toda a vida, colecionadora eu pretendo continuar a ser. Hoje, coleciono sentimentos, sorrisos, sonhos, lembranças. Coleciono o que não precisa de espaço para ser guardado, e, o que é melhor, que pode ser pego, exposto e lembrado a qualquer hora.
Coleciono sorrisos das minhas filhas, carinhos do meu marido, apoio da minha mãe, bençãos da minha avó, risadas das minhas amigas, momentos felizes da minha família, quilômetros corridos, barreiras quebradas, lugares conhecidos, cheiros e sabores sentidos, horas de sono, beijos e abraços. Coleciono até a saudade do que eu queria ter um pouco mais perto de mim. Coleciono vida. E só.