fevereiro 28, 2011

Um Amor de Porco-Espinho.


Há quase 25 anos eu convivo quase diariamente com um porco-espinho. Um porco-espinho que já perdeu, ao longo destes anos todos, muitos dos seus espinhos, tanto que, muitas vezes, chega a parecer um daqueles ursinhos carinhosos que dão vontade da gente abraçar e levar para sempre consigo. Mas, uma vez porco-espinho, sempre porco espinho. E quer saber? Graças a Deus. Graças a Deus que o meu porco-espinho se mantém assim. É que o porco-espinho, na verdade, se utiliza dos seus espinhos apenas para se defender e defender os seus. Então, eu me sinto protegida perto do meu. Quer dizer, da minha. É, meu porco-espinho é fêmea. Fêmea que, apesar dos espinhos, é sensível e sonhadora. Nunca perde aquela paixão que move as adolescentes de quatorze anos que nós duas já fomos um dia. Uma amizade meio inusitada, porque, normalmente, porcos-espinho não são amigos de formigas. Só que a espécie animal não faz a menor diferença quando existe amor de verdade. Aí, começamos a perceber que porcos-espinho e formigas são muito mais parecidos do que se pode imaginar. Pelo menos no nosso caso. Somos tão diferentes e tão iguais ao mesmo tempo. Nos entendemos só com um olhar  ou com meia-palavra. Mas nos entendemos mesmo. Sempre foi assim. Já brigamos algumas vezes. Eu me lembro de três, na verdade. Na primeira, tínhamos aqueles quatorze anos já falados. Nem me lembro do motivo, mas me lembro que ela deixou na portaria do meu prédio uma arvorezinha de papel que, em contato com a água, florescia, com um cartão maravilhoso. Na segunda, já namorávamos com nossos maridos, já fazíamos faculdade. Eu também não me lembro do motivo e nem de como tudo terminou. Nem ela lembraria. Aliás, a memória não é o forte desse porco-espinho.

Na terceira vez, e mais dolorida, já tínhamos nossas filhas, nossas casas. A proximidade sempre foi tão grande entre nós que nos perdemos no nosso próprio espaço, era difícil entender aonde terminava o meu e começava o dela, e vice-versa. Assim também como o espaço de nossas filhas e nossos maridos. Mas passou também, claro. Não tinha como não passar. Eu não podia ficar sem o meu porco-espinho. Acho que também ela não podia ficar sem a sua formiga. Sempre temos o que aprender uma com a outra. Mesmo depois de 25 anos de contato, certamente mais de 5.000 horas no telefone (boa parte dessas horas durante os tão falados quatorze anos) e mais de 2.000 e-mails trocados. Nossas conversas nunca acabam. Nem as nossas risadas.

E o melhor de tudo isso é que rimos mais é de nós mesmas, de tantas coisas que já vivemos juntas. Temos gírias e expressões que poucos entendem. Descobrimos tantas coisas juntas, que acho que poderíamos escrever um livro só com histórias pelas quais passamos. Me lembro exatamente do dia em que ela chegou em minha casa e me acordou, com uma animação que só uma chocólatra entende: “Rê, acorda! Encontrei a caixa da vida!!!!!!!” E eu acordei, extremamente curiosa, para ver pela primeira vez a nova caixa de especialidades da Nestlé. Não sei quantas latas de leite condensado já acompanharam as nossas confidências, quantos litros de sorvete, quantos litros de coca-cola. Quando soubemos que eu não poderia comer chocolate amamentando, logo demos um jeito. Ela comia a casquinha e eu o recheio do bombom Serenata.

É claro que sofremos as conseqüências de todos esses pecados cometidos  e, hoje, também juntas e também morrendo de rir, visitamos quinzenalmente uma nutricionista. Não poderia ser diferente, afinal, até uma fonte de chocolate nós compramos “em sociedade”.

Entre chocolates e dietas, choros e risadas, ouvindo Lulu Santos, Lobão, Pink Floyd, Fleetwood Mac, fomos crescendo. Belo Horizonte, Ouro-Preto, Guarapari, Nova Almeida, Domingos Martins, Vitória, Prado, Porto Seguro, Cachoeira da Fumaça, Rio de Janeiro, Balneário Camboriú, Blumenau, todos estes lugares e mais alguns já testemunharam as nossas risadas. Recentemente, até Orlando e Miami. Sonho realizado para nós duas. Ela chorou como uma criança assistindo ao show Illuminations no Epcot. Aquele choro de alegria mesmo, de verdade. A mesma alegria que eu sinto quando lembro de tudo isso e, mais ainda, quando sei que o meu Porco-Espinho está aqui pertinho, há apenas três ruas de distância, quando sei que amanhã pegarei as nossas filhas na escola, quando sei que se não nos encontrarmos amanhã, certamente nos falaremos no telefone, por e-mail ou até mesmo através do Google Talk – ou tudo isso junto - , quando sei que no fim de semana, invariavelmente, estaremos juntas, na minha casa ou na casa dela, com nossos maridos e filhas, com nossas risadas, nossos churrascos e nossos chocolates. É, hoje os chocolates são diet. Os refrigerantes também. Mas outras coisas nunca vão mudar, eu tenho certeza. É como estava escrito em uma plaquinha de madeira que ela trouxe para mim de uma viagem: Amigo é um irmão que a gente escolhe depois que nasce. É verdade. Acho que escolhemos uma a outra. Somos irmãs mesmo. De alma.

fevereiro 21, 2011

Aula de amor.

Hoje eu levei a minha pequena Elisa para a natação. Levei hoje porque a super-babá-Adelaide precisou ir ao médico. Claro, é preciso um motivo para levar a filha, no meio da tarde, para a natação. Ainda que o processo todo não leve uma hora. Mas, afinal, minha posição de mulher-moderna não permite que eu esteja, no meio da tarde de uma segunda-feira, em um ginásio coberto para acompanhar os progressos aquáticos da minha segunda filha. Confesso que, durante a aula, chequei várias vezes os meus e-mails,  atendi a umas cinco ligações, fiz várias listas do que havia por fazer, mas, ainda assim, eu pude observá-la, ganhando cada vez mais confiança naquela piscina enorme e, claro, se divertindo muito.

Ela já estava usando a bóia em apenas um braço, progresso que eu não vi acontecer. Ela já sabe pular, nadar de costas, encontrar objetos na água, nadar com a prancha, com o tapete, com o espaguete de borracha. Ela já sabe fazer tudo isso sozinha. Eu era quem não sabia das coisas ali. Eu era quem não sabia aonde ficava o banheiro feminino, eu era quem não sabia como ligar o chuveiro. E, claro, não precisei chegar nem perto enquanto ela lavava perfeitamente os cabelos com shampoo e condicionador após a aula. Só assisti. Assisti aquela pequeneza toda enfrentando a piscina sem qualquer medo, sem qualquer sentimento de impossibilidade, sem qualquer dificuldade.

Apenas assisti quando ela pedia ajuda à professora para subir na borda da piscina, com a intimidade de quem conhece a anos aquilo que está fazendo.

Segunda-feira, às três da tarde, e eu não estava em meio a prazos, petições e reuniões. Eu estava recebendo um tchauzinho a cada vez que ela chegava à borda da piscina. Eu estava observando todos os sorrisos e toda a vontade de aprender e conquistar que ela demonstrava. Eu estava aprendendo com aquela pequenina de biquini vermelho e touca prateada a me jogar mais na piscina, sem me preocupar com o medo. Eu estava aprendendo a não deixar de tentar.

Eu adorei a minha aula de natação, a seco. Adorei a minha aula de coragem. Adorei a minha aula de superação. Mas, o que mais adorei mesmo, foi enrolá-la junto a mim, na toalha após o banho. Se fiquei toda molhada? É claro que sim. Mas foi um banho de felicidade e uma aula de amor.

fevereiro 15, 2011

Terapia.

Sempre achei que me encontrava na escrita. Que escrevendo, conseguia me conhecer melhor e entender todas as armadilhas da minha personalidade. Na verdade continuo achando. Escrever sempre foi uma terapia para mim. Talvez por isso seja tão apaixonada por cadernos, canetas e blocos. Já comecei vários diários e já tentei me expressar de várias formas. Criei um caderno de ressentimentos, um caderno de contentamentos, comecei a escrever a minha vida inteira em inglês, tentei poesias, crônicas, um caderno de orações e tudo o que amontoasse palavras e que me desse prazer de ler depois. Muitos destes cadernos ainda existem e me fazem muito bem. A maioria nunca foi lida, não que eu saiba. Não precisava. Eu gosto de derramar palavras, vê-las soltas ou em conjunto, pensar do significado de cada uma, na forma como soam. Algumas palavras me fazem bem só por existirem, mesmo destacadas de seu significado. Prefiro escrevê-las do que pronunciá-las. Escrevo melhor do que falo. Escrevendo, me exponho. Falando, acho que me escondo. Não sei porquê ou de quê, mas me escondo. E esconder não é uma palavra dessas que me fazem bem.

A necessidade de escrever sempre foi mais presente do que a de falar e me peguei pensando nisso agora. Quando escrevo, posso ler ou não. Posso escolher quando ler, como ler, com quem ler. Quando falo, eu me escuto. Necessariamente. Não tenho escolha, me ouço do início ao fim. Será por isso o silêncio? Será por isso a necessidade de escrever?

Descobri a pouco tempo a necessidade de falar. Talvez tenha sido uma descoberta forçada, mas descoberta é sempre uma palavra que me faz bem. Descobri que as palavras também ficam bonitas quando pronunciadas e que escutar a mim mesma também é uma necessidade.

Não paro de escrever. Escrever virou mania, hobby, desejo, hábito, vontade. Escrever sempre me fará bem. Mas as palavras escritas precisarão dividir espaço com as pronunciadas. Sem ciúmes. Sem disputa. A palavra escrita vai ser sempre mais bela aos meus olhos, eu acho. Coisa de personalidade, talvez. Mas eu descobri que quero falar também, nem que seja apenas para mim mesma. E elas, as palavras, continuarão me encantando. Sempre. Cada uma com seu som, sua escrita, seu significado. Juntas ou separadas. Palavras que quero para mim, para sempre.

VERDADE                               SORRISO                     TRAVESSEIRO              BRISA    

FILHA                          FRESCOR                      ESTRELA        CORAÇÃO           AMIGO

NUVEM          CARINHO            ENFIM         SORTE         CHOCOLATE        CHEIRO    

COLORIDO              MARIDO          FLORIDO            AMANHECER             CLAREZA

ESTABELECER         ENQUANTO         SONHO     VIAGEM     PARAÍSO         VONTADE

CHUVA            MÚSICA          OLHOS            PAIXÃO       SOSSEGO           AMOR         FÉ

SENTIMENTO          BEIJO                  VESTIDO           ONDA           LUAR           PRINCÍPIO


Só para citar algumas...

fevereiro 02, 2011

A Dor do Crescimento

Laura: _ Mãe, estou sentindo uma dor nas minhas pernas desde hoje de manhã na escola...

Eu:_ Fez algum exercício diferente, filha?

Laura:_ Não, nada. Começou a doer assim, de repente.

Eu:_ Talvez seja a "dor  do crescimento", filha. Já ouvi dizer que ela existe...

Laura: _ Dor do crescimento, mãe??? Como assim?

Eu:_ É. Uma vez um médico me disse que quando a criança está crescendo, pode sentir algumas dores por causa disso, mas que é normal.

Laura:_ Mãe, é verdade?

Eu: _ É, Laura. Amanhã, se continuar doendo quando você acordar, me fale. Mamãe te leva ao médico.

Laura:_ Tá. Boa Noite, mãe. Te amo. Rosas no seu travesseiro.

Eu:_ Boa Noite, filha. Te amo também. Rosas no seu travesseiro.

Eu, sozinha: Crescer dói mesmo. Em todos os sentidos. E, nesse caso, Laura, acaba doendo mais em mim...